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O Mafioso que me Roubou

Capítulos 4

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O Mafioso que me Roubou Capítulo 6

Luna

O carro avançava pelas ruas de São Paulo. Dante dirigia em silêncio, os olhos presos na estrada, mas cada centímetro do seu corpo parecia alerta. Eu observava a cidade passar pela janela, familiar e estranha ao mesmo tempo. Sabia que, ao final daquele dia, tudo poderia mudar de novo.

— Para onde estamos indo? — perguntei, finalmente quebrando o silêncio.

— Para um dos nossos armazéns. Quero que veja como funciona uma parte do que sustenta essa guerra — ele respondeu, sem tirar os olhos da estrada. — E também quero que conheça algumas pessoas importantes. Pessoas que você talvez precise liderar um dia.

Engasguei com a última parte da frase.

— Liderar? Está brincando, certo?

Ele lançou um olhar rápido na minha direção, um meio sorriso nos lábios.

— Estou sempre sério quando se trata de você, Luna.

O silêncio voltou, mas dessa vez mais carregado. Quando chegamos ao local, um galpão aparentemente abandonado, guardas armados abriram o portão sem questionar. Lá dentro, a movimentação era intensa: homens e mulheres carregavam caixas, digitavam em computadores, analisavam mapas.

— Isso aqui parece uma base militar — murmurei.

— Porque, em certo nível, é. Cada peça, cada informação, cada pessoa aqui é parte de uma rede que mantém meu império de pé. — Ele fez um gesto, chamando um homem alto, moreno, com um leve sotaque espanhol. — Luna, este é Mateo. Um dos meus braços direitos.

Mateo me cumprimentou com um aceno firme.

— Então você é a chave, hein? — disse ele, avaliando-me com curiosidade. — Não achei que fosse tão…

— Cauteloso — completei, sorrindo com ironia. — Nem eu.

Dante trocou um olhar com Mateo, e percebi que aquela era uma espécie de teste. Um dos muitos que viriam.

Fomos levados até uma sala de reuniões. Na mesa, documentos, fotografias, mapas com marcações em vermelho. Dante me apontou onde sentar, sentando-se ao meu lado.

— Marcelo está tentando fechar um acordo com um grupo colombiano. Isso pode nos colocar em desvantagem. Mas você pode nos dar vantagem — disse ele, abrindo um dossiê. — Esses nomes aqui trabalharam com você na empresa dele. Reconhece algum?

Analisei os rostos, sentindo o estômago embrulhar ao reconhecer alguns.

— Esse. Ele era do financeiro. Sempre estava no telefone, saía muito da sala. E essa mulher… ela costumava me observar demais, como se anotasse tudo o que eu dizia.

Dante assentiu, satisfeito.

— Você tem um bom instinto. E é por isso que está aqui.

— Você está me usando. De novo. Só que agora com café da manhã gourmet.

Ele sorriu, mas havia um traço de sinceridade em seus olhos.

— Talvez. Mas também estou te dando escolhas.

Após horas mergulhada naquele ambiente de tensão, saímos do armazém com o pôr do sol se aproximando. No carro, Dante estava mais calado do que antes. O rádio tocava jazz instrumental, preenchendo o silêncio.

— Por que eu? — perguntei. — De todas as pessoas que você podia ter sequestrado… por que me escolheu?

Ele demorou a responder.

— Porque você era o elo mais invisível da cadeia. E, por isso, o mais poderoso. Ninguém te veria vindo. Ninguém suspeita da sombra. Mas eu vi.

Seu olhar cruzou o meu, intenso, inabalável.

— E porque, desde o primeiro segundo que te vi, eu soube que havia algo em você que ninguém mais percebia. Nem você mesma.

Me encolhi contra o banco, não pela ameaça, mas pela verdade daquelas palavras. Parte de mim queria gritar. A outra parte queria entender.

Voltamos para a casa. A noite caiu pesada sobre meus ombros. Não fisicamente. Mas por dentro. Como se uma versão antiga de mim tivesse sido desmontada, peça por peça.

Antes de dormir, Dante bateu à porta.

— Posso entrar?

— Entre! — disse e ele entrou com passos lentos. carregava uma caixa pequena, de madeira escura. Colocou-a sobre a cômoda e me encarou.

— É sua. Algo que pode te ajudar nos dias que virão.

Abri a tampa. Dentro, uma arma. Pequena, discreta. E um bilhete.

Confiança não é fraqueza. É uma escolha perigosa. Faça-a com sabedoria.

Levantei os olhos para ele.

— Isso é um presente ou um aviso?

— Os dois — ele respondeu, com aquele meio sorriso que me deixava sem fôlego.

E saiu, deixando a porta entreaberta.

Fiquei ali, sentada, olhando para o revólver como se ele fosse um espelho. Porque talvez fosse mesmo. Um reflexo do que eu estava me tornando.

Naquela noite, sonhei com fogo.

Chamas dançavam ao meu redor, lambendo paredes invisíveis, consumindo tudo que eu conhecia, minha antiga vida, os rostos familiares, os corredores frios da empresa onde eu trabalhava. Tudo virava cinza. No centro daquele inferno, havia uma sombra. Alta, imóvel. Observando. E, mesmo sem ver os traços, eu sabia quem era. Dante. Imperturbável, envolto em fumaça e mistério, como se aquele caos ao redor fosse seu lar. E, de alguma forma perversa, também fosse o meu.

Tentei correr, mas minhas pernas não respondiam. O fogo não queimava minha pele, mas corroía algo mais profundo, minha resistência, minha negação, minha antiga identidade. E quando finalmente o encarei, vi que seus olhos não refletiam o fogo… refletiam a mim. E eu era a faísca.

Acordei ofegante, o quarto mergulhado na penumbra suave antes do amanhecer. O lençol estava torcido ao meu redor, como se eu tivesse lutado com ele a noite toda. E talvez tivesse mesmo. Lutei comigo. Com tudo que vinha acontecendo. Com a ideia de que estava presa e, ao mesmo tempo, estranhamente livre.

Olhei ao redor do quarto luxuoso que já não parecia tão estranho. Havia algo inquietante naquela sensação de pertencimento que começava a surgir sem permissão. O que era para ser temporário, uma prisão decorada, começava a se infiltrar em mim. Um hábito. Um novo padrão de realidade.

Sentei na cama, abraçando os joelhos. Tentei recuperar o controle, me lembrar de quem eu era antes daquele nome, Dante Moretti, atravessar minha vida feito uma bala. Mas tudo parecia embaçado. Como se minha antiga identidade estivesse se desmanchando em fumaça, igual ao sonho.

Não era só sobre ele. Era sobre mim.

Eu havia mudado.

Não pela roupa cara no armário, nem pela comida refinada ou os corredores silenciosos da mansão. Mas porque, desde o momento em que fui arrancada do mundo que conhecia, fui obrigada a olhar para dentro. E o que encontrei ali não era uma mulher fraca, nem uma vítima. Era uma mulher em construção. Alguém que aprendia rápido. Que absorvia o perigo como combustível.

A imagem de Dante surgiu na minha mente de novo. Os olhos atentos, a voz grave, a forma como ele parecia sempre dois passos à frente. Ele me assustava, claro que sim. Mas também me despertava. Desafiava. Me via de um jeito que ninguém antes havia visto.

E isso... era viciante.

Levantei, caminhei até a janela. A cidade ainda dormia. E naquele silêncio, me dei conta de algo que doía mais do que qualquer verdade jogada por Dante ou qualquer traição de Marcelo:

Eu não queria fugir.

Ou talvez quisesse… mas não agora.

Porque havia algo ali, dentro daquele jogo perigoso, que me atraía. Um desejo ardente de entender tudo, de me antecipar, de vencer. Como se eu finalmente tivesse encontrado um tabuleiro à minha altura. E o próprio Dante… o adversário perfeito. Ou talvez o parceiro que eu nunca soube que precisava.

Suspirei. Longo, profundo. E pela primeira vez em muito tempo, senti algo parecido com clareza. Eu ainda estava no olho do furacão. Ainda não sabia em quem confiar. Ainda não tinha todas as peças. Mas havia uma certeza queimando dentro de mim com mais intensidade do que o sonho:

Nada seria fácil daqui pra frente.

E tudo bem.

Porque eu também já não era mais fácil de destruir.

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