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O Mafioso que me Roubou

Capítulos 4

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O Mafioso que me Roubou Capítulo 7

Luna

O relógio marcava 10h43 quando Dante me conduziu a um dos andares inferiores da mansão. A escada era de mármore negro, e as luzes suaves dos abajures de parede davam ao ambiente um ar quase sagrado, como se estivéssemos entrando em um templo. Ou em uma câmara de verdades perigosas.

Caminhamos em silêncio. Ele não me disse para onde íamos. Eu também não perguntei. Estava ocupada demais tentando conter a sensação de que o chão estava prestes a ruir debaixo dos meus pés.

Quando as portas duplas se abriram, dei de cara com uma sala de arquivos. Moderna. Vidros blindados, gavetas digitalizadas, monitores embutidos nas paredes. Parecia mais o centro de controle de uma operação do governo do que parte da casa de um mafioso.

— O que é isso? — murmurei, sentindo o estômago apertar.

— Seu passado. E talvez, seu futuro — ele respondeu, caminhando até um dos painéis e digitando um código.

A tela piscou, revelando um perfil. O meu.

Meu rosto. Meu nome completo. Meus dados. Mas conforme a página rolava, começaram a aparecer coisas que eu nunca tinha visto. Contas bancárias em meu nome. Movimentações em paraísos fiscais. Registros de entrada e saída em aeroportos — viagens que eu nunca fiz.

— Isso… isso é montagem.

— Não é. É o que o Marcelo Rivas construiu pra você — ele respondeu, virando-se pra me encarar. — Uma identidade perfeita. Que o protegia.

Meu coração começou a bater mais rápido. Sentei devagar na cadeira giratória, as mãos tremendo. Ali, diante de mim, estava a confirmação de algo que eu vinha suspeitando há dias, mas não queria aceitar.

— Por quê?

— Porque você era descartável. Mas com potencial. Inteligente o suficiente pra parecer útil, mas ignorante o bastante pra não perceber o jogo. Perfeita pra esconder a sujeira dele.

— E você? Vai me usar do mesmo jeito?

Dante se aproximou, cruzando os braços. Seus olhos me estudavam com aquele olhar analítico que eu já começava a conhecer bem.

— A diferença é que eu te mostro o tabuleiro. E deixo você mover as peças.

— Desde que eu jogue do seu lado.

— Ou do lado certo — ele rebateu, calmo. — Eu não sou um santo, Luna. Nunca fui. Mas Marcelo… ele destrói por conveniência. Eu destruo por necessidade. É uma linha tênue, mas real.

Olhei para o dossiê mais uma vez. Cada número, cada documento, era uma parte de mim que eu não conhecia. Como se minha história tivesse sido escrita por mãos que nunca toquei.

— E minha família? — perguntei, de repente. — Meus pais... eles sabiam?

Dante hesitou. Por um segundo, vi uma sombra cruzar seu rosto.

— Seus pais morreram num acidente. Verdadeiro. Mas Marcelo foi o responsável por te colocar sob tutela do sistema que ele mesmo manipulava. Até conseguir te contratar. Desde os seus dezoito anos, você pertence a ele.

A palavra “pertence” me cortou como uma lâmina. Senti o gosto amargo da raiva subindo pela garganta. Levantei de um salto, empurrando a cadeira com força.

— Eu não sou propriedade de ninguém.

— Então prove. — A voz dele foi firme, mas baixa. — Use o que agora sabe. E escolha o que fazer com isso.

Eu queria gritar. Quebrar aquele painel. Rasgar aquelas páginas. Apagar aquela versão falsa de mim que Marcelo criou. Mas eu sabia, no fundo, que o estrago já estava feito. E que me destruir não ia mudar o fato de que eu existia em dois mundos agora: o que vivi… e o que foi fabricado.

— O que você quer que eu faça?

Dante se aproximou. Lento. Cauteloso. Como se estivesse diante de uma fera ferida — e talvez estivesse.

— Eu quero que você descubra o que pode ser. Por você mesma. Sem Marcelo. Sem mim. Escolha seu lado. Mas faça isso com os olhos abertos.

Por um instante, não houve guerra entre nós. Nem tensão. Apenas duas pessoas tentando se encontrar no meio do caos.

— Me leva pra ver mais. — Minha voz saiu baixa, mas firme. — Se vou entrar nesse jogo, quero conhecer o campo.

Ele assentiu. E sem mais palavras, me conduziu para fora da sala.

***

Passamos o resto da tarde entre reuniões silenciosas, câmeras de segurança, relatórios codificados. Dante me mostrou as operações. As alianças. Os riscos. Não escondeu nada. Nem mesmo os atos mais sombrios.

Vi rostos que nunca imaginei encontrar. Vi dinheiro sujo circulando com a naturalidade de um café passado. Vi o poder em sua forma mais crua, e pela primeira vez, entendi que aquilo tudo era mais do que crime. Era uma estrutura. Uma rede. Uma força que moldava decisões políticas, guerras silenciosas, ruínas e ascensões.

E eu estava ali. No centro.

Quando a noite caiu, voltamos para o alto da mansão. Chiara me esperava com um jantar leve e um copo de vinho. Mas eu mal consegui tocar na comida.

— Está digerindo — Dante disse, ao ver minha expressão. — É normal. O mundo real é mais indigesto que qualquer veneno.

— Eu vivi numa ilusão, não é? — perguntei, encarando a taça. — Acreditando que era livre. Que fazia escolhas.

— Agora está acordando. E isso assusta.

Levantei os olhos pra ele. O homem que me sequestrou. Que me desvendou. Que me desafiava a cada segundo a ser mais do que uma peça de tabuleiro.

— O que acontece se eu escolher não fazer parte disso?

— Você não tem mais essa opção. — Ele disse sem rodeios. — Mas pode decidir se quer ser dominada por isso… ou dominar.

A sinceridade dele me atingia com mais força do que qualquer mentira. E mesmo que eu odiasse admitir… algo dentro de mim começava a responder.

Talvez não fosse sobre Marcelo. Nem sobre Dante. Talvez fosse sobre mim.

Quem eu seria, agora que a verdade tinha sido revelada?

Antes de subir para o quarto, Dante se aproximou. O toque dele em meu pulso foi breve, quase respeitoso, mas carregado de intenção.

— Amanhã, você começa a treinar com meu time. Quero que saiba se defender. E atacar, se for preciso.

— Você quer que eu me torne uma arma?

— Não. Quero que saiba quando usar a lâmina.

Me afastei devagar, mas sem cortar o contato dos olhos. Eu ainda não confiava nele. Mas... confiava mais em mim quando estava perto dele. E isso era estranho. Perigoso.

Subi as escadas sozinha. Cada degrau parecia uma escolha.

Lá em cima, no silêncio do quarto, abri o armário e encarei meu reflexo. A mulher que me olhava de volta tinha a mesma boca. Os mesmos olhos. Mas algo havia mudado. Havia uma força ali. Uma nova cicatriz. Invisível, mas definitiva.

Deitei na cama, com a mente fervendo. E naquela noite, quando o sono me venceu, sonhei com fogo. Sonhei com destruição. Sonhei com Dante, parado entre as chamas, oferecendo sua mão mais uma vez.

E acordei com a certeza mais terrível de todas:

Nada seria fácil dali em diante.

Mas eu também já não era mais fácil de destruir.

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