A Jornada do Último Guerreiro Capítulo 6
A Calmaria Antes da Tempestade
A noite caiu sobre Liang com uma serenidade enganadora. O vilarejo, envolto em silêncio, parecia o retrato perfeito da paz, com as estrelas pontilhando o céu claro e a lua cheia iluminando os telhados das casas. Era uma tranquilidade que sempre trazia conforto a Tao, mas naquela noite, algo estava diferente. A quietude parecia carregada, como se o ar estivesse pesado, impregnado de uma tensão invisível. Tao não sabia dizer o porquê, mas uma sensação incômoda o dominava.
Depois de uma longa jornada nos campos com seu pai, Tao se deitou em sua cama, esperando que o cansaço o levasse a um sono rápido e reparador. Mas, em vez disso, ficou olhando para o teto, sentindo o coração bater mais rápido do que o normal. Cada sombra projetada pela luz suave da lua parecia estranha, ameaçadora, como se estivessem se movendo levemente, à espreita.
Ele se revirou na cama, inquieto. “Por que estava tão ansioso?” Algo dentro dele gritava, mas ele não sabia o quê. Talvez fosse o próprio peso da decisão que tinha tomado de partir. Ou talvez fosse outra coisa. Alguma coisa que ele não conseguia ver, mas podia sentir, rastejando sobre a superfície da calmaria noturna.
O vento soprou lá fora, uma brisa leve, mas que fez as janelas de sua casa tremerem levemente. Tao se levantou, sentindo-se incapaz de continuar na cama. Caminhou até a janela e olhou para fora. O vilarejo parecia o mesmo de sempre, mas seus instintos lhe diziam que algo estava errado.
Ele tentou afastar o pensamento. “Estou imaginando coisas. Só estou nervoso com tudo isso.” Mas, quanto mais tentava ignorar a sensação, mais ela parecia se intensificar. Tao olhou para as montanhas à distância, aquelas que o chamavam. Era como se elas estivessem envoltas em uma névoa sombria que não estava lá antes.
Ele se sentou à beira da janela, os braços cruzados sobre o peitoril, tentando buscar algum consolo nas paisagens familiares. A lua brilhava acima das montanhas, sua luz prateada refletida nas colinas e vales, como sempre. Contudo, ao longe, uma leve sombra parecia se mover. Tao apertou os olhos, tentando enxergar melhor, mas a visão desapareceu tão rápido quanto surgiu.
“O que foi isso?” Ele se perguntou, com o coração acelerado. Talvez fosse apenas sua imaginação brincando com ele. Mas o instinto o avisava de outra coisa. Uma onda de calafrio percorreu sua espinha, e ele não pôde evitar pensar nas palavras de Shen: "Às vezes, para descobrir quem somos, precisamos nos perder."
De repente, uma batida suave na porta o tirou de seus pensamentos.
— Tao? — era a voz de Mei, sua mãe.
Ele abriu a porta e viu que ela também não conseguia dormir. Seu rosto, normalmente tranquilo, mostrava um leve traço de preocupação.
— Mãe? — perguntou ele, preocupado. — O que foi?
Mei entrou devagar no quarto, fechando a porta atrás de si. Ela parecia hesitante, como se estivesse lutando contra algo dentro de si mesma. Finalmente, após um longo suspiro, ela se aproximou do filho.
— Eu também não consigo dormir, — disse ela, a voz mais baixa do que o normal, como se não quisesse incomodar o silêncio da noite. — E há algo... algo no ar essa noite.
Wang franziu o cenho, sentindo o mesmo.
— Eu senti isso também. Como se... — ele hesitou, não querendo parecer tolo. — Como se algo estivesse errado, mas não consigo entender o que é.
Mei assentiu, sentando-se ao lado da janela, com os olhos perdidos nas sombras do vilarejo.
— Quando eu era mais jovem, — começou ela, sua voz embalada por lembranças distantes, — eu tinha essa mesma sensação antes de uma grande tempestade. Não era apenas o vento, ou as nuvens, mas um sentimento no ar, como se o mundo inteiro estivesse se segurando... esperando por algo.
Tao a ouviu em silêncio, absorvendo as palavras como se elas estivessem trazendo à tona uma verdade que ele não queria reconhecer. O que sua mãe estava dizendo refletia perfeitamente o que ele sentia. A noite estava calma demais, e essa calmaria parecia um prenúncio de algo maior.
— Você acha que algo está para acontecer? — perguntou ele, a voz carregada de incerteza.
Mei olhou para ele com um olhar profundo, seus olhos escuros cheios de preocupação.
— Eu não sei, meu filho. Mas eu sei que as mudanças sempre vêm depois dessas noites de silêncio. E quando elas chegam, nada mais volta a ser como era.
As palavras de Mei deixaram uma marca em Tao. O jovem sentiu como se estivesse à beira de um precipício invisível, onde o próximo passo que desse poderia levá-lo para o desconhecido. Ele queria acreditar que estava apenas sendo influenciado por seus próprios medos, mas algo no fundo de sua alma sussurrava que sua mãe estava certa.
Naquele momento, um uivo distante ecoou pela noite. Tao e Mei trocaram olhares rápidos. “Um lobo?” Não era incomum que animais rondassem os arredores do vilarejo, mas o som parecia vir de mais longe, quase como se estivesse nascendo das montanhas.
Mei se levantou, seu corpo tenso.
— Está começando, — sussurrou ela, sem explicar o que queria dizer. Tao franziu o cenho.
— Começando? O que está começando?
Ela não respondeu imediatamente, apenas o encarou, seu olhar cheio de emoção. Mei sempre foi uma mulher que valorizava a paz, mas naquela noite, ele via nela uma tensão diferente. Era como se ela soubesse que algo terrível estava à espreita.
— Você sentiu esse chamado dentro de si, — ela disse finalmente. — Algo que quer que você vá embora, não é?
Tao ficou sem palavras por um momento. Como ela poderia saber disso?
— Sim... mas como você...?
Mei fechou os olhos por um breve momento.
— O mesmo aconteceu com seu pai, antes de ele partir e retornar anos depois, mudado, — ela sussurrou, abrindo os olhos lentamente. — Esse chamado é antigo, e ele traz mudanças. Acredito que, antes do amanhecer, algo vai acontecer que mudará o curso de tudo.
Wang se levantou, o corpo agora tomado por uma sensação crescente de urgência. Ele sentiu que precisava estar pronto. Para o quê? Ele ainda não sabia, mas a cada segundo que passava, a tensão crescia como uma onda que se aproximava.
A noite, que antes parecia tão serena, agora estava carregada de presságios. Tao e Mei permaneceram em silêncio, observando a escuridão além da janela. O uivo dos lobos se repetiu, desta vez mais próximo.
— Mãe, o que você acha que vai acontecer?
Mei o olhou novamente, e desta vez sua voz saiu com uma mistura de tristeza e aceitação.
— Não sei, meu filho. Mas sei que esta será uma noite decisiva. Para você, para todos nós. E seja o que for que venha, não teremos como voltar atrás.
Tao sentiu um frio percorrer sua espinha, mas, ao mesmo tempo, uma determinação crescia em seu peito. “A tempestade está chegando.”
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