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Meu Tritão

Capítulos 10

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Meu Tritão Capítulo 1

O vento carregava o cheiro salgado do oceano enquanto Athos segurava firme o leme do pequeno barco e a ilha surgiu à sua frente.
 
Ela era menor do que imaginava, cercada por falésias negras que se erguiam como muralhas naturais. A névoa dançava sobre a superfície da água, e por um momento, ele teve a estranha sensação de que a ilha o observava.
 
Athos soltou um suspiro e puxou seu diário de couro surrado da mochila, folheando as páginas até encontrar as anotações sobre aquele lugar.
 
— Ilha de Vaelith… — murmurou para si mesmo, passando os dedos sobre a caligrafia rabiscada. — Conhecida por seus relatos sobre criaturas marinhas… pescadores falam de cânticos à noite e sombras entre as ondas.
 
Ele balançou a cabeça, esboçando um sorriso. Criaturas marinhas? Sombras? Tudo aquilo soava como lenda de marinheiro, histórias para assustar os desavisados. Mas, ainda assim, algo dentro dele o impelia a explorar. Era essa sede pelo desconhecido que o levara até ali. Com um empurrão firme, ele jogou a âncora e pulou para a areia úmida.
 
Athos parou e franziu a testa. Uma melodia…
 
Baixa, quase um sussurro, como se a própria água estivesse cantando.
 
Ele girou o corpo, atento. O som parecia vir de além da praia, talvez do outro lado da floresta densa que cobria parte da ilha. Seu coração bateu mais rápido.
 
“Alucinação?”, pensou, mas não conseguia afastar a sensação de que aquela canção o chamava.
 
Com passos cuidadosos, seguiu pela areia até a borda da floresta. As árvores retorcidas formavam túneis de sombras, seus galhos enroscados como braços tentando impedi-lo de passar.
 
A melodia aumentava.
 
Athos sentiu um arrepio na nuca.
 
O caminho terminou abruptamente em um desfiladeiro. Lá embaixo, o mar se chocava violentamente contra as rochas, formando redemoinhos de espuma prateada sob a luz fraca da lua crescente.
 
E foi quando ele a viu. Algo movia-se na água.
 
Primeiro, apenas uma sombra. Depois, um brilho azul profundo, deslizando entre as ondas. A criatura nadava com uma graça hipnotizante, como se fosse parte do oceano. Suas escamas reluziam sob a luz, e um rastro bioluminescente a seguia conforme mergulhava e emergia.
 
Athos prendeu a respiração. O canto vinha dali.
 
Seu coração disparou. Ele se inclinou mais sobre a beirada, tentando enxergar melhor. Seria uma ilusão? Algum tipo de animal que nunca vira antes?
A criatura parou.
 
Por um longo momento, tudo ficou em silêncio.
 
Então, girou lentamente na água, e Athos sentiu seu corpo congelar quando um par de olhos brilhantes encontraram os seus.
Eles eram diferentes de qualquer coisa que já vira. Não eram olhos de peixe, nem de tubarão. Eram intensos, quase humanos, mas com um brilho etéreo, profundo como o próprio oceano.
Athos sentiu um nó na garganta.
 
Antes que pudesse reagir, um trovão ribombou no céu. Nuvens pesadas cobriram a lua, e o vento ficou cortante. Ondas começaram a crescer abaixo, girando ao redor da criatura.
E então, a água se moveu.
 
O mar se ergueu em um redemoinho violento, puxando a corrente para dentro de si. A força do vento quase o derrubou, e quando tentou recuar, a beira da falésia cedeu sob seus pés.
 
— Não! — gritou, sentindo o vazio abaixo.
 
A última coisa que viu antes de ser engolido pelas águas foi a silhueta da criatura nadando em sua direção.
 
E aqueles olhos brilhantes.
 
A água o engoliu como um predador faminto. O impacto contra o mar foi brutal, arrancando o ar de seus pulmões. Athos se debateu instintivamente, tentando nadar para cima, mas a corrente era forte, puxando-o cada vez mais para baixo.
 
A escuridão o envolvia, e seus membros começavam a pesar como se fossem feitos de pedra. Seu peito queimava, implorando por ar. Desespero tomou conta de seus sentidos.
“Eu vou morrer aqui…”
 
Foi então que mãos frias tocaram sua pele.
 
No meio da névoa de bolhas ao seu redor, Athos sentiu um par de braços fortes envolvendo sua cintura. Algo deslizou ao seu lado, rápido, ágil, movendo-se como se a própria água fosse sua aliada.
Ele tentou abrir os olhos, e mesmo embaçado, conseguiu ver a silhueta da criatura… Não, de alguém.
A mesma figura que vira antes. O brilho azul emanava de seu corpo, refletindo na pele pálida e nos cabelos escuros que flutuavam ao redor de seu rosto. Seus olhos, aqueles olhos brilhantes, estavam fixos nele.
 
A falta de ar nublava seus pensamentos, mas ainda assim, Athos sentiu algo diferente.
 
Era calor. Um calor que parecia fluir diretamente da criatura para ele, como se o mar ao redor não fosse gélido, como se aquela presença o envolvesse em algo inexplicável.
Então, algo inesperado aconteceu.
 
Os lábios frios pressionaram os seus.
 
Por um segundo, Athos não entendeu. Mas no instante seguinte, percebeu: o estranho estava passando-lhe ar.
 
Uma onda de oxigênio encheu seus pulmões, queimando como fogo em seu peito. O instinto de sobrevivência falou mais alto e, sem pensar, Athos segurou os ombros da criatura, sentindo a textura da pele, firme, fria, mas viva.
 
E então, ele foi puxado.
 
Como um raio cortando as profundezas, foram em direção à superfície. O mundo parecia girar, e antes que conseguisse entender o que acontecia, sua cabeça rompeu a linha d’água.
 
Ele tossiu violentamente, sugando o ar como se fosse a coisa mais preciosa que já tivera. Seu corpo tremia, o coração martelava no peito.
Os braços ao seu redor ainda o seguravam.
 
Quando finalmente conseguiu respirar, ergueu o olhar e se deparou com a criatura novamente. Desta vez, viu claramente.
Um homem.
 
Ou quase.
 
A pele era marcada por pequenos traços luminescentes, um reflexo do brilho do mar. Os cabelos, negros como a noite, flutuavam com a brisa do oceano. Mas o mais impressionante era a cauda, escamas azul-escuras e prateadas reluziam sob a luz da lua, formando um poderoso e elegante rabo de tritão.
 
Athos piscou, sem saber se era real ou um delírio causado pelo quase afogamento. O ser o observava em silêncio.
 
Até que, por fim, ele falou.
 
— Você quase se tornou presa do mar, humano. A voz era profunda com um tom provocador.
Athos ainda lutava para recuperar o fôlego, tentando entender a situação.
 
— Eu… — Sua voz saiu rouca, mas ele se forçou a continuar. — O que… você é? O tritão inclinou a cabeça, como se estivesse surpreso com a pergunta.
 
— Meu nome é Carbius. — Sua cauda se moveu levemente na água, mantendo-os à tona sem esforço. — E você está na minha ilha.
 
Athos arregalou os olhos.
 
— Sua… ilha?
 
O tritão sorriu de lado, um brilho divertido passando por seus olhos.
 
— Sim. E agora, me diga, humano… por que veio até aqui?
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