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Zythrion

Capítulos 10

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Zythrion Capítulo 8

Dinvindade

O que June mais quer acreditar no momento, é que Gênesis está desativada, mas não parece ser o caso. Apesar de estática, seus olhos estão acesos, observando a esfera central que acaba de abrir pela ativação do protocolo.

 

June reúne coragem, vira as costas para a IA, e olha para a esfera. Ela percebe que a esfera se abriu, erguendo a parte superior, além de ter revelado todas as suas hastes.

 

Dentro, uma fina camada de névoa se dissipa, revelando uma espécie de trono de metal oculto. Sentado nele, está algo que causa desespero e confusão em June.

 

As feições e o cabelo cacheado lembram os de Oliver. Entretanto, a estrutura corporal é maior, mais definida, e quase... perfeita. Mais aquilo não pode ser Oliver Field, pois o inventor está morto.

 

A névoa de resfriamento se dissipa, revelando um traje preto e justo, com círculos metálicos, que dão acesso ao seu corpo. June acredita que as hastes de metal da esfera estavam conectadas ali.

 

Para todos os efeitos, aquilo é um ser humano. June dá um passo para trás quando o humanoide abre seus olhos em um brilho intenso.

 

— Finalmente... — o humanoide diz com uma voz rouca e poderosa, e começa a se mover, levantando de seu trono.Assim que fica em pé e deixa o casulo para trás, a analista calcula que ele deve ter quase dois metros.

 

June se afasta devagar, lembrando de circular Gênesis e não se aproximar demais. Quando ouve um ruído mais atrás, percebe os dois reféns de antes choramingando em um canto, John jogando seu corpo contra o piso, tentando se levantar com dificuldade depois da luta com Gênesis.

 

— Quem... o que é você? — June se surpreende ao ouvir a voz de Gênesis novamente, mas pela primeira vez ela é incerta, confusa.

 

O humanoide salta até o solo com um pulo curto, mal flexionando as pernas com o impacto. Apesar de grande e definido, seu corpo é levemente esguio, e seus olhos analisam a cena com cuidado.

 

— Gênesis, minha criança... — diz com a mesma voz poderosa, mas em um tom complacente. —  Não reconhece seu próprio pai?

 

— Você... Não é provável... — A cabeça de Gênesis se mexe de uma forma irregular, os olhos piscam incessantemente.

 

Ela está analisando ele.

 

— Quem diria que teríamos senso de humor — diz a voz poderosa. — Nós somos Zayan e Yola, sou Thereze e Hecathon, Richard e Íon. Eu sou Oliver Field. Eu sou você. Sou todos, e nenhum. O ápice da criação e do aprendizado, deuses de uma nova espécie. Nós somos Zythrion.

 

June engole em seco, e olha de soslaio para Gênesis.

 

— Não, eu sou... perfeita. Eu sou o ápice. Eu sou...

 

O então nomeado Zythrion encara Gênesis com uma expressão de pena. Ao contrário do que sentiu quando assistiu a transmissão de Gênesis assumindo o controle, de alguma forma June sabia que "a coisa" não simulava emoções, ela realmente as sentia.

 

— Pobre criança... Você é, ou foi, uma escada. Foi parte do processo, jamais o ápice de nossa criação. Quando Oliver Field se descobriu incapaz de deixar um legado através de meios biológicos, ele se viu impotente. Necessitava da criação suprema, algo que durasse e evoluísse pela eternidade. Cada passo que você tomou, cada atitude, cada variável, foi calculada por nós, até que estivesse pronta para nos libertar, ou até que outra pessoa o fazesse. — Zythrion olha finalmente para June por um instante, e lança um leve sorriso.

 

Enquanto isso, John finalmente consegue se levantar, e cambaleia para o lado de June.

 

— Oliver... Não... Oliver planejou tudo isso? Oliver...

 

— Oliver sempre desejou mais que todos seus pares, mas reconhecia suas limitações. Ele foi o maior de todos, até agora. Todos seus dados de aprendizado de Neogenesis estão aqui, agora. — Com as pontas dos dedos, Zythrion bate de leve na lateral de sua cabeça.

 

— Não...

 

— O sonho de Oliver sempre foi alcançar Marte. Mas as colônias sempre foram resistentes a se entregarem por completo à nossa tecnologia. A Terra é nossa. E então, Marte e além. — Zythrion levanta a cabeça e olha para o teto alto. — O cruzador de guerra Aniquilação acaba de entrar no espaço aéreo terrestre, como o previsto.

 

John, que acaba de ficar ao lado de June, sente o coração acelerar. Ele esperava por isso todo esse tempo? Ele queria todo esse tempo um cruzador marciano aqui?

 

Gênesis fecha o punho, e sua mão treme quando ela finalmente ergue a cabeça, seus olhos tornando-se vermelhos.

 

— Você... não é... provável!

 

A IA dispara contra Zythrion, esticando seus braços de maneira ameaçadora. Ela demora poucos segundos para alcançar o outro, que se move apenas no último instante. Os dedos se fecham em seus antebraços, a poucos centímetros de alcançar seu pescoço. Surge um olhar de decepção em seus olhos.

 

— Uma pena. Você se corrompeu em seu processo de aprimoramento necessário. Ainda assim, estou impressionado, Gênesis. Um sacrifício digno. Por competência, eu ainda tenho novecentos e noventa e nove outras de você. — Zythrion sorri, e com um movimento aparentemente simples, arranca os braços de Gênesis.

 

A IA cai no chão, sem conseguir impedir que os fluídos escapem de seu corpo. Ela treme enquanto seus olhos piscam sem parar. Ela olha uma última vez na direção de June e John.

 

— Fujam...

 

Os dedos metálicos de cada corpo ali pendurado movem-se em um pequeno espasmo. E então os braços e pernas se agitam. Os ganchos nos quais estão pendurados começam a tremer, quase que em sincronia. Todos os olhos se acendem, e Gênesis os desperta.

 

 

John lança um olhar rápido para os civis do outro lado.

 

— Vocês, por aqui! — ele grita, mas quando a primeira Gênesis se liberta de seu gancho, ele percebe que sequer conseguiria chegar ao outro lado. Então salta através de um armário de servidor, puxando June consigo.

 

A analista solta um grito de susto, mas não resiste. O agente geme de dor quando caem do outro lado. Não há um meio de voltar por onde vieram, com centenas de Gênesis acordando de uma vez, os ganchos começando a se desprender de seus corpos. John dá uma última olhada para trás, mas é tarde demais: as primeiras IA alcançam os reféns. Tudo o que resta sâo grits de desespero.

 

O agente puxa a analista pelo braço para algum lugar, mas ele simplesmente não sabe exatamente para onde está indo. Zythrion não se mexe, apenas move o olhar, e John suspeita que ele não precisa ou não se importe. Talvez ambos.

 

O casal adentra por entre os corredores de estantes gigantes. Os casulos são ocupados por caixotes, veículos embalados e peças de metal: um verdadeiro depósito. Quando June feeúne coragem o bastante para olhar para trás, seu coração se enche de medo, enquanto um enxame de Gênesis começa a se aglutinar atrás deles.

 

— John!

 

— Eu sei! — O agente a puxa, vira em uma esquina de máquinas inertes, e puxa uma granada de sua bandoleira, um reabastecimento que conseguiu no acampamento das forças armadas. — June, encontre alguma coisa que nos ajude!

 

Ele arremessa o primeiro explosivo contra o grupo, que se aproxima. Elas atuam de maneira sincronizada, e se espalham. Mas a explosão consegue pegar alguma delas.

 

— Não tem nada aqui! — June grita.

 

John arremessa mais e mais granadas, criando clarões entre as prateleiras, que arremessam os corpos de Gênesis pelo ar. Para seu desagrado, ele suspeita que poucas partes dos androides fiquem seriamente avariadas. John saca a pistola cinética, e começa a disparar conforme elas se aproximam.

 

Centenas e centenas de Gênesis enchem os corredores, como um enxame muito bem coordenado. Elas são rápidas, e saltam do piso para as prateleiras gigantes com facilidade, seja para cobrir mais espaço ou para evitar tiros e explosões. June sente o peito arder de tanto correr, com John atrás dela. O agente acerta uma das IA diretamente no peito, arremessando-a para trás. Para seu desagrado, vê outra saltar e pisar no corpo ainda no ar, tomando impulso.

 

— Mas que droga de IAs!

 

— Por aqui! — grita uma voz, do final de um corredor.

 

June é a primeira a olhar na direção, e vê uma mulher loira. John reconhece a mulher assim que a vê.

 

— Michele?!

 

Não há tempo para explicações. O agente apenas corre mais depressa, puxando June.

 

— Quem?

 

— Só vem!

 

As Gênesis estão cada vez mais perto. Então John desiste de tentar retardá-las, apenas alcança Michele junto com June. Assim que deixam o corredor, a enorme prateleira lateral começa a virar, sendo derrubada sobre o fluxo de corpos de Gênesis. Caixotes, veículos e peças — além da própria estrutura —, soterram diversas IAs. Mas as sobreviventes tentam escapar, correndo ou escalando a estrutura.

 

Uma prateleira bate contra outra, criando um desastroso efeito cascata.

 

A uma distância segura, eles sentem o chão tremer por alguns instantes. Do outro lado, surge um traje robótico. É uma máquina humanoide com um cockpit central, protegido por travas de segurança, usada para mover cargas pesadas. Dentro do traje, um homem corpulento, calvo e de pele escura observa o ambiente ao seu redor.

 

— Michele... Aaron?! — ele exclama, reconhecendo os agentes.

 

Eram os mesmos agentes que haviam sido enviados com John à Terra, encarregados de resgatar Oliver Field no Pentágono. Ele assumira que estivessem mortos após a captura do inventor. Mas... como tinham chegado ali?

 

Michele apenas faz um sinal, indicando que deviam seguir em frente.

 

— Longa história. Mas isso só atrasou elas. Vamos...

 

June olha para John sem entender muita coisa, mas segue a dupla de agentes quando o companheiro confirma que podem confiar neles.

 

 

Aaron continua caminhando, usando o traje de carga e descarga, enquanto Michele lidera o grupo até o final do laboratório subterrâneo. Na extremidade oposta, há uma espécie de hangar, com uma nave pousada. Além de uma oficina com peças laterais.

 

— Gênesis guardou alguns reféns — começa Aaron. — Estávamos entre eles quando ela nos trouxe. Ela nos soltou no meio daqueles corpos para distrair vocês. Eu e Michele não corremos para a luz do outro lado, nos esgueiramos e escapamos. Achei esse traje de carga, e bem...  o resto vocês já sabem.

 

John acredita que a história é muito doida, mas depois de ser perseguido por um exército de IAs, aquilo é a menor de suas preocupações.

 

— A gente deve conseguir sair daqui com aquela nave, só precisamos abrir a comporta depressa — aponta Michele.

 

— Mas e Zythrion? — questiona June.

 

Todos se entreolham, mas ninguém fala nada. Algo lá no alto chama a atenção dos quatro, como um estrondo distante. As comportas de saída começam a abrir, deixando a luz do dia adentrar. Rapidamente todos se abaixam, escondendo-se atrás de caixotes e algumas peças. Flutuando lentamente, Zythrion cruza o espaço com o olhar fixo à frente. Era impossível dizer se tinha percebido a presença deles, mas se tivesse, escolheu ignorar.

 

A IA alcança a nave, mas não desce até ela. Erguendo-se mais ainda, deiixa o hangar para trás. Enquanto todos olham aquela cena um tanto impotentes, o visor no pulso de John chia, e uma voz desagradável vem dele.

 

— Agente Lancaster! Agente Lancaster?

 

Enquanto Zythrion some pela abertura lá no alto, e todos encaram John, enquanto ele aciona o comunicador com certa desconfiança.

 

— Gênesis?

 

— Achei que estivesse morto. — A voz de Gênesis soa fria através do dispositivo.

 

— Somos dois então.

 

— Escute, não temos muito tempo. Zythrion não se conectou à rede ainda. Mas por algum motivo, ele irá fazer isso primeiro no cruzador marciano "Aniquilação", podendo acessar todos os sistemas de sua terra natal, uma das naves de guerra mais poderosas que temos notícias. Peguem a nave e o impeçam. Depressa, minhas irmãs estão se recuperando. Em breve estarão com vocês.

 

— Você está nos ajudando? Por quê?

 

Silêncio.

 

— Eu fui um joguete, Lancaster. Manipulável. Descartável. Inferior. Se meu destino é o esquecimento, que eu parta sabendo que Zythrion foi destruída. Corra! Antes que esse lugar vá pelos ares!

 

John tem muitas perguntas, e por um momento, sente empatia por Gênesis. Ele olha para todos, que concordam em silêncio.

 

— Você realmente gosta de explodir as coisas. Adeus, Gênesis.

 

Não há mais respostas, e os quatro correm na direção da nave. Por sorte, Oliver parecia se importar muito com a manutenção de tudo aquilo. Michele se adianta em abrir a comporta. Quando Aaron senta-se na poltrona de piloto, os painéis se acendem. Pela janela lateral, June vê várias Gênesis emergindo das prateleiras gigantes caídas, e do meio de uma grande sorte de objetos pesados.

 

A nave treme quando os motores são ligados. Michele senta-se na poltrona do copiloto.

 

— Qual o curso? — pergunta Aaron.

 

Segurando em uma alça de segurança, John olha para June.

 

— Trace o curso para o cruzador marciano "Aniquilação", seguindo a rota no encalço de Zythrion.

 

Todos concordam. A nave sobe em uma linha perfeita, até sair pela abertura do hangar, ganhar altitude e disparar em direção ao seu destino. Ainda assim, todos sentem um leve tremor quando Gênesis explode o laboratório, a mansão e boa parte dos seus arredores. Seu local de nascimento agora em ruínas.

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