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O Monge de Cister

Capítulos 15

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O Monge de Cister: Tomo I I - O COLÉGIO DE S. PAULO

Ora vede que door seria para o triste do Pay.
DR. JOÃO DE BARROS, Espelho de Casados.

 

– Vamos, Fr. Vasco, em que cismas? Há mais de meia hora que levas os olhos pregados na corrente do rio. Ergue-os para o Céu. Olha como é formoso! Imagem do empíreo, onde mora Aquele que só te pode dar, que só te há dado consolação e esperança. Vamos, filho; é necessário que por uma vez acabem essas tristezas, que denotam estar ainda muito enraizada na tua alma uma paixão mundana.

 

– Oh meu segundo pai, oh meu mestre, oh vós que mil vezes me tendes salvado de mim mesmo, perdoai-me. Má ideia era a que me passava agora pela cabeça. Afigurava-se-me neste momento que D. Leonor estava junto de mim: via-a, aqui mesmo ao meu lado; via-lhe o sorrir suave; ouvia-lhe o respirar sereno; sentia o brando cheiro dos perfumes dos seus cabelos dourados. Ai! e sabeis qual era a minha ideia? Era apertá-la ainda entre estes braços, de que fugiu como uma vã sombra, e então... atirar-me com ela a esse rio, que vai rápido como o envelhecer desta alma, fundo como a amargura do meu coração! Depois – prosseguiu ele com voz atada, depois... que viesse o inferno.

 

– Jesus, Vasco! Estás doido? Blasfemas? Assassinares uma fraca mulher, assassinares-te a ti próprio e renegares da vida eterna?

 

– Uma fraca mulher, dizeis vós, reverendo nono? Uma fraca mulher?!... Fraqueza de víbora, que vos toma atraiçoadamente quando dormis e vos morde e vos envenena sem remédio a essência da vida. Essa fraca mulher teve força para me calcar aos pés este pobre coração, que era bom, que nascera para amar quantos o rodeavam! Homem de Deus, não sabeis o que e ver cerrar diante de nos o mundo no primeiro quartel da vida, quando a imaginação povoa esse mundo de gozos, de glória, de felicidade! Vos não sabeis que mistério infernal se passa ca dentro, quando a uma risada de mulher que supúnhamos um anjo e que era um demónio, a vemos tomar nas mãos o nosso futuro e esmigalhá-lo em terra! Assassinar uma fraca mulher?! E ela não me assassinou a mim? Que sou eu debaixo desta estamenha? Um morto que fala e anda e geme, e contudo não vive, porque o viver nada disso e... Padre, padre, Deus me livre de mim mesmo!... Mas Vos chorais? Oh não, não!... O pobre Vasco esta louco. Dissestes bem... Esquecei-vos dos seus desvarios. Prometo a Virgem jejuar três dias a pão e agua, coberto de cilícios, logo que cheguemos ao nosso mosteiro, para que Deus me perdoe as blasfémias que tenho dito. Vós também me perdoareis. Não e assim, bom Fr. Lourenço?

 

– Sim, sim, meu irmão, perdoo-te o escândalo, que me deste. Também eu cobrirei a minha cabeça de vaso; cingirei os meus rins de cilício e ajudar-te-ei a implorar a misericórdia, do Senhor, para que te alumie e afaste do teu espírito as tentações de Satanás.

 

– Oh, como sois bom, meu nono! – disse entre soluços o outro interlocutor, lançando-se a seus pés e beijando-lhe a fímbria do grosseiro hábito.

 

Depois ergueu-se e assentou-se-lhe ao lado, apertando-lhe uma das mãos entre as suas e derramando sobre elas lagrimas como punhos, que calam a espaços, quentes qual lume, porque do intimo vinham elas.

 

Mas quem eram estes dois homens? Onde estavam? Donde vinham? Para onde iam? Em que tempo era isto? Natural e que o leitor faça tais perguntas, as quais temos obrigação de responder.

 

Os dois personagens entre os quais se travara o diálogo com que começamos esta mui verídica história eram dois monges de Cister ou de S. Bernardo. O mais moço, de cuja boca saiam as expressões de desesperação que acima ficam transcritas, era mancebo de vinte e dois a vinte e cinco anos, bem proporcionado e robusto, tez morena e cabelo negro, basto e crespo, feições talvez não formosas, mas, sem dúvida, atractivas. Os seus olhos eram portugueses; isto é, reflexo perene dos íntimos pensamentos; tempestuosos com as procelas do coração, serenos com a calma dele. No rosto do mancebo estava escrito o nome da sua terra natal: era um filho das Espanhas: a cor, o gesto, o olhar, tudo dizia que aí dentro havia o espírito de um godo e ao mesmo tempo que nessas veias corria o sangue de um árabe.

 

O outro monge era homem de idade robusta, Tinha os cabelos espessos e grisalhos, testa espaçosa, nariz aquilino, os olhos fundos, vivos e pequenos. jejuns e meditações lhe haviam emarelecido e encovado as faces. O todo do seu aspecto era severo e triste, mas quem lho observasse atento lá enxergaria, por baixo dessa superficial tristeza, a alegria que gera uma boa consciência. Quando o velho erguia os olhos ao Céu crer-se-ia que, através da abobada azul, divisava a pátria do repouso, que ele ia conquistando com vigílias e sofrimentos sob o peso da cruz. Tumulto ou quietação, angustia ou gozos da vida eram para ele o mesmo que para o peregrino o fumozinho da aldeia do vale, onde apenas dormiu uma noite, visto da cumeada da serra que lho vai esconder para sempre; eram uma lembrança, uma saudade duvidosa da juventude; porque o mundo ia lá muito longe dele, movendo-se orgulhoso e senhoril em suas misérias ou grandezas. Das paixões que este ou alimenta ou gera só uma restava a Fr. Lourenço; era a paixão que ensina o Evangelho, era o amor do género humano.

 

Fr. Lourenço, chamado o Bacharel por ter estudado degredos ou cânones na Universidade de Lisboa, entrara na Ordem de Cister ia homem feito e aí fora recebido com os braços abertos, não só pela reputação de sabedor e letrado de que gozava, mas também por ser pessoa de virtude e bondoso. O abade de Alcobaça, D. João de Ornelas, tinha-o nomeado procurador daquele celebre mosteiro, que Ia gozava de certa supremacia sobre os outros da mesma ordem, apesar de, na sua origem, todos serem independentes uns dos outros. Os negócios fradescos obrigavam, portanto, Fr. Lourenço a viver na Corte; e como então residissem cistercienses no Colégio ou Estudaria de S. Paulo e Santo Elói (depois Convento dos Bons Homens de Vilar), que fora fundado pelo bispo D. Domingos Jardo em tempo de D. Dinis, e por isso fossem obrigados a ter aí lentes ou ledores de diversas matérias, Fr. Lourenço, quando se via desapressado de negócios, ora ensinava ali as doutrinas das decretais, ciência. tão seria, tão útil, tão profunda e tão cultivada nesses tempos como a política, o magnetismo animal ou a homeopatia nestes nossos, ora lia aos escolares, que muitos Ia andavam, a santa Teologia, no que também o bom do bernardo era poço sem fundo.

 

Chamamos bom a Fr. Lourenço, e com razão assim o qualificámos. Apesar das emburilhadas e demandas em que frequentes vezes o metia o despótico, violento, cobiçoso e ao mesmo tempo perdulário D. João de Ornelas; apesar dos trabalhos escolásticos, que não pouco lhe quebravam a cabeça, Fr. Lourenço Bacharel ainda sabia achar tempo para gastar em obras de caridade. Onde havia um desgraçado que socorrer ou consolar, lá estava o nosso cisterciense: rico de sua casa e abastado de sollayros ou ordenados, que recebia como ledor da estudaria (e não eram maus os que deixara D. Domingos Jardo para sustentaçom dos proves escolasticos), todos os haveres gastava com os necessitados, e nenhum se afastava dele com as mãos vazias – «juxta illud», dizia Fr. Lourenço, «que lemos na Escritura, demerge ta orelha o prove, sem nem uma acidia, e dá-lhe sa divida». O povo tinha-o em conta de santo; a Corte respeitava-o, e ate, quando o seu cargo de procurador o obrigava a fulminar perante os juizes os adversários da sua ordem, sabia-o fazer com tal modéstia que o tom das suas palavras ainda lhe dava maior realce à eloquência do que a força da sua dialéctica vigorosa. Enfim era, como todos diziam então dele na linguagem garrafal daquele tempo, barom triguosamente endereçante sa carreira per mui vertuosas vertudes a perduravil einxalçamento em vida eternal.

 

No momento em que esta história começa dava ele uma prova mais do seu ardente amor do próximo. Nesse dia pela manhã recebera um recado, em que se lhe pedia fosse ouvir de confissão uma pobre mulher quase moribunda que vivia na aldeia de Restelo, uma légua de Lisboa para a banda do mar a beira do Tejo. Como era dia de S. Filipe e Sant'Iago e não havia escola, Fr. Lourenço não hesitou um momento: disse missa, chamou o escolar seu predilecto, Fr. Vasco, partiu com ele do colégio, veio pela Rua Nova abaixo e, passada a fonte de D. Sancho 11, saiu pela Porta da Oura, chegou a praia, afretou uma barca, e ei-lo correndo ao longo da margem, caminho da aldeia de Restelo.

 

Fora dentro dessa barca onde se travara o misterioso dialogo que acima fica transcrito sem mudar uma palavra, pospor ou antepor uma vírgula.

 

Agora cumpre voltar um pouco atras para sabermos quem era o companheiro do mestre de Teologia.

 

Haveria seis meses, depois que Fr. Lourenço residia na Estudaria de S. Paulo, quando certo dia um cavaleiro moço e gentil-homem chegou sozinho a porta da crasta e perguntou por Fr. Lourenço. Levado por ordem do reverendo a sua estreita cela, demorou-se a sós com ele por horas largas. O que aí se passou ninguém soube; mas notou o porteiro que, quando o mancebo saiu, o velho veio acompanhá-lo, e que tanto o desconhecido como Fr. Lourenço tinham as faces banhadas em lagrimas. Abraçaram-se à despedida, e apenas o frade disse ao cavaleiro quando partia: «Filho, constância em teu santo propósito!» Depois ninguém mais tornou a ver o mancebo; mas todos pensaram que era algum desgraçado pecador que, não podendo sofrer o peso de suas culpas, viera depositar no seio do virtuoso monge a confissão de passados erros e aquietar remordimentos da consciência pedindo perdão ao Céu.

 

Passou mais um ano: certo dia pela volta da tarde., o converso Fr. Julião, que desempenhava havia bem um quarto de século as funções de porteiro da estudaria, veio correndo a cela do mestre de Teologia e disse da parte de fora:

 

Benedicite, pater doctor.

 

– Entrai, Fr. Julião.

 

O converso ou barbato, como então chamavam aos leigos, ergueu a aldrava e com as mãos cruzadas sobre o peito esperou que o padre-mestre o mandasse falar.

 

– Que me quereis, irmão?

 

– Uma carta do domno de Alcobaça.

 

Dizendo estas palavras, o converso punha nas mãos do monge um papel fechado e selado com o selo do abade de Alcobaça, a quem por seu cargo competia, segundo a regra de S. Bento, seguida pelos cistercienses, o título de dominus, ou no romance daquele tempo domno.

 

– Quem traz esta carta?

 

– Um monge do hábito do nosso padre S. Bernardo. E voto a Cristo, que me parece o mesmo mancebo que vos aqui procurou ha um ano...

 

– Basta! Não jureis em vão o santo nome de Deus. Ide e guiai para esta cela o recém-chegado.

 

Quando este entrou no aposento de Fr. Lourenço, logo ele viu que o converso se não enganara. O bom do monge correu a abraça-lo:

 

– Parabéns, parabéns! – exclamou Fr. Lourenço cheio de júbilo. – Este santo hábito que trazeis, senhor cavaleiro... não digo bem... irmão Fr. Vasco, me diz que Deus vos fez triunfar dos três grandes inimigos da humanal geração, mundo, diabo e carne. Socorrestes-vos ao Senhor no dia da vossa aflição, e o Senhor vos abriu o porto bonançoso onde podeis rir-vos das procelas da vida. Sois monge de Cister e agora...

 

– Sou monge de Cister! – repetiu o moço frade, escondendo a cabeça no seio de Fr. Lourenço, que breve sentiu as suas lagrimas ardentes e abundantes traspassarem-lhe a grosseira estamenha do escapulário e da túnica e humedecerem-lhe o peito. O acento com que o mancebo proferiu aquelas palavras fazia que elas significassem exactamente o contrario do que soavam. De monge havia nele, e verdade, o hábito e a cogula, mas o coração?! No coração de Fr. Vasco estavam ainda todas as paixões do século, tumultuosas, férvidas, corrosivas, como quando, em vez de trajar essa tela grosseira, cobria os membros robustos com o arnês de cavaleiro. Se aí havia alguma diferença, era que essas paixões violentíssimas, comprimidas por um ano de noviciado, por um ano de abjecção, de silencio, de contradições, de sujeição, enfim, a todos os actos exteriores de humildade, de doçura e de resignação, se tinham tornado mais ásperas e azedado mais aquela alma lacerada por dores fundas e talvez eternas. Fr. Lourenço, a quem ele buscara havia um ano, em dia no qual a desesperação passara a meta do sofrimento, lhe aconselhara o claustro, como remédio único ao mal que o roía. O pobre frade, pouco entendido nas tempestades do mundo, cria que havia outro adito cerrado ao tumultuar das paixões que não fosse a lousa da sepultura; cria que esse adito milagroso era a portaria de um convento! Se quereis saber se ele errava ou acertava, perguntai-o a qualquer desses que aí viveram, se ainda algum há a quem a fome deixe contar histórias dos tempos que ia lá vão.

 

– Mas, filho – dizia Fr. Lourenço, levantando brandamente a cabeça de Fr. Vasco e encostando-a outra vez sobre o ombro, de modo que o hálito ardente do mancebo quase que lhe crestava a face –, cria eu que a misericórdia divina e a virtude do nosso santo habito vos houvessem arredado do espirito essas negras imaginações. Mas, enfim, com o tempo; com o tempo! Fiai-vos de mim: de mim em quem achareis um irmão: mais que um irmão, um amigo!

 

– Oh sim! foi por isso: foi para vos ouvir, para dar alguns instante de frescor a este espírito requeimado, que, apenas fiz meus votos, pedi ao domno de Alcobaça me mandasse para Lisboa estudar. Estudar!... Que posso eu aprender? ou que me importa? É falar com o homem indulgente que eu quero: e pedir-vos palavras de consolação e de esperança; que me apagueis esta chama que me consome a alma; que me deis triaga contra a peçonha que me lavra no coração. Homem de Deus, o mundo chama-vos santo! Paz e esquecimento! paz e esquecimento!...

 

Mais se confirmou Fr. Lourenço por este desalinhado discurso que a virtude mirifica do santo hábito nada aproveitara em Fr. Vasco; mas, por um movimento de orgulho involuntário, lembrou-se de que com desesperados como este a força da sua eloquência tinha suprido a pouca eficácia da graça divina. Fez então assentar o moço e obrigou-o a tomar alguma refeição enquanto descansava; depois, pondo-lhe a mão no ombro, disse-lhe:

 

– Vamos, irmão Vasco, contai-me outra vez a vossa historia. Choraremos ambos! As lagrimas da piedade consolam quando e um amigo que as derrama. Se bem me lembra, dissestes-me há um ano...

 

O frade pensou avisadamente que, falando repetidas vezes a Fr. Vasco nos dolorosos sucessos da sua vida, lhe chegaria a embotar na memória o sentimento deles. E, em verdade, assim e feito o coração humano. A dor, como a matéria bruta, gasta-se com o uso. São mistérios metafísico-fisiológico-morais desta espécie de animal chamado homem, a que eu e tu, leitor, temos a honra de pertencer.

 

– Disse-vos – prosseguiu o mancebo, tomando a mão imediatamente –, disse-vos que, filho de um cavaleiro nobre e honrado, segui as armas mui moço. Há três anos, não longe da morada de meu velho pai, em Aljubarrota, pelejava eu na Ala dos Namorados por livra-lo a ele e a terra da pátria do estranho domínio: pelejava na ala de Mem Rodrigues, porque amava a nobre donzela Leonor; e vos sabeis que Mem Rodrigues só dava entrada naquela ala aos que tinham urna dama dos seus pensamentos. Vencemos essa memorável peleja. Segui, depois, o pendão do Condestável. Passados alguns meses de recontros e pelejas, voltei a terra onde nasci. Pulava-me o coração ao ver ao longe o campanário da nossa abadia. Ia ainda ver o meu pobre pai, rezar um pater junto a lousa de minha mãe, abraçar Beatriz minha irmã, tão linda! tão meiga! e que eu amava quase como Leonor. Oh! e também ia vê-la a ela, que, por certo, nem um só dia deixara de se lembrar de mim; ia contar-lhe, não os feitos de armas, mas as saudades do seu cavaleiro! Ribeiros, fazia-os galgar de um pulo ao meu ginete; veigas, fazia-lhas desaparecer debaixo dos pés; outeiros, obrigava-o a transpô-los como se fossem plainos. O último tinha-o descido quando o Sol, envolto na sua vermelhidão de tarde, entestava com a Terra Ia no horizonte. Sente-se, mas não se diz o que eu então sentia. Cheguei. Ã entrada da povoação era a abadia: a igreja estava fechada, e o sacristão a porta com as chaves na mão. já não era o do meu tempo: fez-me isso tristeza. Perguntei sem saber porque:

 

«– O abade vela ou jaz?

 

«– Em trintário cerrado aí dentro e com outros clérigos.

 

«– Por quem é o trintário? – prossegui eu inquieto.

 

«– Por um bom fidalgo da vizinhança que morreu, segundo dizem, de pena, porque uma filha que tinha e muito amava fugiu com um cavaleiro a quem, passado por aqui, ele dera gasalhado por algum tempo. Nunca mais comeu nem bebeu, e como era velho finou-se.

 

«– Fazendo assim, fora moço e se finara -disse eu sorrindo descuidado, enquanto procurava na memória quem seria o fidalgo.

 

Nenhum que eu soubesse nos arredores tinha filha donzela, senão meu pai e o de Leonor; mas que fosse algum deles claro estava que era impossível. Ia a apertar ainda uma vez os acicates ao ginete para chegar antes da noite a ponte levadiça dos meus paços acastelados, mas por demais perguntei ao sacristão o nome do morto que jazia em trintário... Era o de meu pai!... Uma faísca de lume me centelhou diante dos olhos: de um pulo eu estava pegado com a porta da igreja: as escamas das minhas manoplas bateram nela como um vaivém e, com um som que se prolongou pelas naves, via-a aberta e lá no meio uma tumba cercada de brandões acesos e ao redor padres que rezavam latim. Logo me achei ao pé deles: abri a tumba: era meu velho pai... era ele!... Com os olhos fechados, não me viu... com os lábios cerrados, não me sorriu... com as mãos cruzadas sobre o peito, não me abençoou!... Arrojei-me sobre ele: beijei-o: era como uma pedra gelada! Um dos que aí estavam disse não sei o que, chegou-se a mim e quis arrancar-me dali. Estendi com fúria o braço: a minha manopla tornou a encontrar o que quer que foi. Ouvi um grito rouco e como um corpo de homem que cala desamparado sobre as lájeas do pavimento. Não percebi mais nada; porque nesse momento perdi os sentidos.

 

Aqui Fr. Vasco fez uma larga pausa, correndo a mão pela testa, como quem afastava uma ideia dolorosa. Tinha os lábios brancos, e nos olhos bailavam-lhe duas lagrimas. Pelas faces de Fr. Lourenço já outras duas tinham escorregado. 

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