Drácula Capítulo VI
DIÁRIO DE MINA MURRAY
24 de julho — Whitby — Lucy foi me esperar na estação e de lá fomos para a casa em Crescent, onde elas alugaram quartos.
É um lugar lindo. O rio Ersk atravessa o vale; que vai se alargando, à medida que se aproxima do porto. À direita da cidade, ficam as ruínas da Abadia de Whitby, que dizem ser mal-assombrada pela Dama de Branco. Entre essas ruínas e a cidade, fica outra igreja, a paroquial, rodeada por um grande cemitério. Na minha opinião, é o lugar mais bonito de Whitby, pois de lá se tem uma vista linda para o porto. Muita gente passeia por ali e senta- se nos bancos, admirando a paisagem. É de um desses bancos que escrevo estas linhas. A meu lado, está sentado um velho marinheiro, de rosto queimado pelo sol. Diz que tem quase cem anos e era marinheiro da frota de pesca da Groenlândia por ocasião de Waterloo. Creio que é um tanto cético, pois, quando lhe perguntei pela Dama de Branco, respondeu:
- Não acredito nisso, senhorita. São coisas que passaram. Não digo que não tenham existido, mas não foram de meu tempo.
Quando o relógio bateu seis horas, ele se levantou, com esforço, explicando-me:
- Tenho de voltar para casa, senhorita. Minha neta não gosta de me esperar para o chá.
Afastou-se, descendo a escada o mais depressa que pôde. Essa escada é uma característica deste lugar. Vai da cidade à igreja e tem centenas de degraus, fazendo uma curva discreta. A encosta é tão suave que até a cavalo pode ser galgada.
Agora, vou para casa. Lucy saiu, para fazer visitas com sua mãe, mas já deve ter voltado.
25 de julho — Cheguei aqui com Lucy há uma hora e tivemos uma conversa muito interessante com meu velho amigo e dois outros que sempre ficam com ele e que o consideram, sem dúvida, como seu mestre. Lucy estava linda, com seu vestido branco; ganhou uma bela cor depois que chegou aqui. Notei como os velhos vêm se sentar ao seu lado, mal ela aparece. Também, é tão amável com eles!
Insisti com o velho marinheiro sobre as lendas, mas ele, mais uma vez, deu mostra de seu ceticismo.
Eu e Lucy ficamos algum tempo, e ela me falou de novo a respeito de Arthur e de seu próximo casamento. Isso me fez sofrer um pouco, pois há um mês não tenho notícias de Jonathan.
Mesmo dia — Vim aqui sozinha, pois estou muito triste. Não havia carta para mim.
Espero que tudo esteja correndo bem para Jonathan. O relógio acaba de bater nove horas. Contemplo as luzes da cidade e penso em Jonathan. Onde estará a uma hora destas? Por que não está aqui, perto de mim?
DIÁRIO DO DR. SEWARD
5 de junho — Quanto mais interessante se torna o caso de Renfield, menos compreendo.
Ele possui certas qualidades muito desenvolvidas: personalidade, capacidade de guardar segredo e curiosidade. Queria saber qual é o objetivo dessa última qualidade. Parece ter arquitetado algum plano. Sua maior qualidade é o amor pelos animais, embora, às vezes sua atitude me leve a crer que é apenas anormalmente cruel. Seu passatempo agora é pegar moscas. Tem uma enorme quantidade delas.
18 de junho — Agora, passou a se interessar pelas aranhas e tem vários exemplares, muito grandes, numa caixa. Alimenta-as com suas moscas, cujo número diminui, embora ele se utilize de metade de seu alimento para apanhá-las.
1.° de julho — Suas aranhas estão aumentando demais e dei-lhe ordem de acabar com elas, como já lhe dera de acabar com as moscas. 8 de julho — Sua loucura tem um certo método, não resta dúvida. Agora resolveu se distrair com os pardais e já amansou um quase inteiramente. Seu método de amansá-lo é simples, pois as aranhas já diminuíram. As que restam, contudo, estão bem alimentadas, pois ele continua a pegar moscas com a comida.
19 de julho — Estamos progredindo. Meu amigo tem agora toda uma colônia de pardais e as moscas e aranhas estão quase esquecidas. Quando entrei, correu para mim, fazendo- me festas como um cão e implorou-me que lhe desse um gato, ao menos um gatinho...
Recusei-lhe, porém.
20 de julho — Estive com Renfield hoje cedo. Procurei os pássaros e, não os encontrando, perguntei-lhe onde estavam. Sem se voltar, pois estava de novo caçando moscas, ele me respondeu que tinham fugido. Mas havia penas pelo quarto e, no travesseiro, uma gota de sangue.
11 horas — O guarda acaba de me dizer que Renfield está passando mal, tendo vomitado muitas penas. “Acho, doutor, que ele comeu os pássaros crus, com pena e tudo”
— disse-me o guarda.
11 da noite — Dei um forte soporífero a Renfield. Meu maníaco homicida é de uma
espécie peculiar. Inventarei uma nova classificação para ele: maníaco zoófago (comedor de vida). O que ele deseja é absorver tantas vidas quanto seja possível. Deu muitas moscas a uma aranha, muitas aranhas a um pardal, e queria um gato para comer muitos pardais...
DIÁRIO DE MINA MURRAY
26 de julho — Estou preocupada com Jonathan e com Lucy, também. Não tinha notícias de Jonathan há muito tempo, quando ontem o Sr. Hawkins, que é muito atencioso comigo, mostrou-me uma carta dele, anunciando seu regresso, em poucas palavras. É esquisito, nem parece carta de Jonathan.
A saúde de Lucy, também, me preocupa. Está bem disposta, mas voltou a seu velho sonambulismo. Conversei a respeito disso com a mãe dela e prometi fechar, todas as noites, com cuidado, a porta do nosso quarto, Lucy está dormindo no quarto comigo. A Sra. Westenra está muito preocupada, pois acha que os sonâmbulos caminham pelos telhadós, de onde se arriscam a cair e fraturar o crânio. Coitada, gosta tanto da filha! Contou-me que o marido tinha o mesmo hábito: levantava-se, à noite, dormindo, vestia-se e sala, se não fosse impedido. Lucy vai se casar no próximo outono e está muito preocupada com o enxoval. Isso me faz desejar ainda mais ardentemente o regresso de Jonathan. O Sr.
Holmwood — o Exmo. Sr. Arthur Holmwood, filho único de Lord Godalming — virá se reunir a nós dentro de pouco tempo, logo que possa sair da cidade, pois seu pai não está passando bem, e Lucy está contando as horas, ansiosa.
27 de julho — Continuo sem notícias de Jonathan, o que me preocupa muito. Se ele me escrevesse ao menos uma linha! Lucy continua com sonambulismo e todas as noites acordo com ela caminhando pelo quarto. Felizmente o tempo está bom e não há perigo dela apanhar um resfriado. Mas a falta de sono está me afetando e estou ficando nervosa.
Felizmente, Lucy está passando bem. O Sr. Holmwood continua preso junto do pai, cujo estado de saúde está se agravando.
3 de agosto — Mais uma semana, e nenhuma notícia de Joriathori, nem mesmo para o Sr. Hawkins. Deus queira que não esteja doente! A letra de sua última carta é dele mesmo, mas a carta não me satisfez. Lucy não caminhou muito dormindo durante a última semana.
6 de agosto — Outros três dias sem notícia. Essa expectativa é insuportável. Se ao menos eu soubesse para onde escrever ou ir, sentir-me-ia menos preocupada; mas não tive a menor notícia dele, depois de sua última carta. Só me resta rezar a Deus, pedindo paciência.
Durante a noite passada, ventou muito, e os marinheiros achavam que estávamos na
iminência de uma tempestade. Hoje, o nevoeiro está muito forte. Todos os barcos de pesca rumam. para terra. Encontrei-me com o velho marinheiro e fiquei admirada com sua mudança: estava realmente abatido, prevendo naufrágios.
Fiquei satisfeita quando um guarda costeiro aproximou-se, empunhando um binóculo.
Parou para conversar comigo, como faz sempre, mas olhava, constantemente, para um estranho navio.
— Pelo aspecto, deve ser russo — disse ele. — Não parece estar sendo dirigido; deve estar vendo a tempestade aproximar-se, mas parece que não se decide se segue para o norte ou se entra aqui. Vamos ouvir falar dele antes de amanhã a estas horas.
Indíce
-
Na Literaz, a leitura gratuita é possível graças à exibição de anúncios.
-
Ao continuar lendo, você apoia os autores e a literatura independente.
-
Obrigado por fazer parte dessa jornada!