Noites Sangrentas Capítulo 14
O Monstro Interior
Carlos ajoelhava-se no chão da cabana, os dedos cravados na cabeça, como se tentasse conter algo prestes a explodir. Sua respiração era entrecortada, quase ofegante, enquanto cada músculo de seu corpo pulsava sob a tensão extrema, à beira de ceder. O ar parecia vibrar ao redor dele, pesado e sufocante, como se a própria cabana estivesse começando a sucumbir à dor que ele sentia.
Encostado na parede, Jonathan observava a cena, o horror estampado em seu rosto. Sua voz saiu trêmula, quase um sussurro: “Carlos... o que está acontecendo com você?”
Carlos ergueu o rosto devagar, como se cada movimento exigisse um esforço descomunal. Sua expressão oscilava entre a dor e algo inumano, algo sombrio que parecia não ser dele. Sob as sombras, seus olhos reluziam com um brilho amarelado, intenso e predatório. Um calafrio percorreu a espinha de Jonathan, e o terror apertou sua garganta.
“Eu não sei...”, murmurou Carlos, a voz rouca, quase irreconhecível, como se estivesse falando de alguém que não fosse ele.
Do outro lado da cabana, a criatura continuava imóvel, observando os dois como um predador analisando sua presa. Ela rosnou baixo, e o som pareceu vibrar dentro do peito de Jonathan, como se reverberasse nos ossos. Cada poro de sua pele se arrepiava.
Jonathan tentou se levantar, mas a dor o impediu. Ele apontou a arma para a criatura novamente, mas sua mão tremia, como se o metal da pistola fosse pesado demais para seu corpo. “Carlos, você tem que sair daí! Essa coisa vai te matar!”
Carlos não respondeu. Seus olhos estavam fixos na criatura, como se algo invisível os conectasse, como se ela fosse a única coisa que ele podia ver. Quando ela deu um passo à frente, Carlos, de maneira quase instintiva, fez o mesmo, como se fosse uma dança — reflexos, um passo atrás do outro, como se fossem uma única entidade.
“Carlos! Para com isso! O que você está fazendo?!” Jonathan gritou, mas sua voz parecia distante, perdida no vácuo da cabana, como se ele fosse só um espectador daquela cena grotesca.
A criatura avançou repentinamente, e Carlos reagiu com uma agilidade que Jonathan não conseguia compreender. Ele deu um salto para trás, mas, no processo, perdeu o equilíbrio e caiu, os músculos se contorcendo em dor, como se estivesse em guerra com seu próprio corpo. Quando tentou se levantar, suas mãos tremiam violentamente, e uma dor excruciante percorreu seu corpo, como se ele estivesse rasgando de dentro para fora.
Ele gritou, mas o som que saiu não era mais humano. Era um som primal, profundo, gutural, que reverberou pelas paredes da cabana, gelando Jonathan até os ossos.
“Carlos...?”, chamou Jonathan, sem acreditar no que ouvia. A voz dele estava carregada de incredulidade, mas também de uma tristeza crescente.
Carlos olhou para ele, mas seus olhos já não eram os mesmos. Eles brilhavam intensamente, suas pupilas dilatadas como as de um animal selvagem, um predador, e suas mãos haviam mudado — os dedos eram mais longos, com unhas que agora se assemelhavam a garras.
Jonathan arregalou os olhos, o horror estampado em seu rosto. “Não... não pode ser...”
Carlos caiu novamente, o corpo tremendo enquanto sua respiração se tornava mais pesada. Cada músculo parecia pulsar, e sua pele brilhava com o suor, como se algo estivesse tentando sair de dentro dele. Ele gemeu de dor, segurando o peito como se fosse um fardo que não conseguia carregar.
“Jonathan...”, murmurou ele, a voz carregada de agonia. “Eu... não consigo... parar.”
Jonathan ficou sem palavras. Ele observava, impotente, enquanto o amigo — seu parceiro — começava a mudar diante de seus olhos, a transformação vindo de dentro de Carlos, deformando-o aos poucos.
A criatura rosnou novamente, mais alto desta vez, como se estivesse se comunicando com Carlos. Ela avançou mais um passo, mas não atacou. Carlos ergueu a cabeça e encarou-a, seus olhos brilhando com a mesma intensidade, desafiando-a, como se algo dentro dele tivesse se acendido.
Ele sentiu algo dentro de si reagir ao rosnado. Era como se uma parte esquecida de sua alma estivesse despertando, como se aquela criatura fosse mais parte dele do que ele jamais imaginou. Cada batida de seu coração era um tambor que ecoava em seus ouvidos, misturando-se ao rosnado da criatura, criando uma música selvagem e hipnótica.
De repente, Carlos sentiu a dor desaparecer. Seu corpo parou de tremer, mas ele sabia que algo havia mudado. Ele levantou-se lentamente, seus movimentos mais fluidos, quase animalescos. Jonathan, ainda caído, balançou a cabeça, incrédulo. “Carlos... você é...”
“Não!”, gritou Carlos, interrompendo-o com uma voz que agora misturava o humano e o animal, como se duas entidades falassem ao mesmo tempo. “Eu não sou isso!”
A criatura rugiu, mas Carlos respondeu com um rosnado tão intenso que fez as paredes da cabana vibrarem. Jonathan cobriu os ouvidos, sentindo o som reverberar dentro de sua cabeça.
Carlos avançou, mais rápido do que Jonathan jamais o vira. Ele enfrentou a criatura, agarrando-a pelos ombros e empurrando-a para fora da cabana com uma força que parecia impossível para um homem comum.
Do lado de fora, sob a luz da lua cheia, a luta começou. A criatura atacou com suas garras, rasgando a camisa de Carlos e deixando marcas profundas em sua pele, mas ele não recuou. Pelo contrário, parecia que cada golpe despertava nele algo ainda mais primal, algo que ele não podia mais controlar.
Jonathan arrastou-se para a porta, observando a cena com horror e fascinação. Carlos não era mais apenas humano. Seu corpo estava mudando a cada movimento — os músculos mais definidos, as mãos agora completamente transformadas em garras, e os dentes brilhando sob a luz da lua.
A luta era brutal. Carlos atacava com uma ferocidade que parecia rivalizar com a da criatura, e por um momento, Jonathan teve dificuldade em distinguir os dois. Era como se a linha entre caçador e monstro tivesse desaparecido completamente.
“Carlos!”, gritou Jonathan, mas ele não parecia ouvir.
A criatura rugiu novamente, mas Carlos respondeu com um golpe poderoso que a fez recuar. Ele avançou, empurrando-a contra uma árvore com tanta força que o tronco rachou. A criatura caiu ao chão, ofegante, mas não tentou contra-atacar.
Carlos ficou parado sobre ela, o peito subindo e descendo rapidamente. Seu rosto estava coberto de suor e sangue, e seus olhos brilhavam como os de um predador. Ele ergueu a mão, agora completamente transformada em uma garra, e preparou-se para o golpe final.
“Carlos, pare!”, gritou Jonathan, correndo para ele.
Carlos hesitou. Ele olhou para Jonathan, e, por um instante, parecia que algo humano ainda permanecia nele.
“Não é isso que você é!”, continuou Jonathan, a voz desesperada. “Você ainda é você! Carlos, ouça a minha voz!”
Carlos piscou, os olhos mudando levemente. Ele olhou para a criatura caída diante dele, que agora o encarava com algo que parecia... submissão.
“Carlos...”, murmurou Jonathan, aproximando-se lentamente.
Carlos recuou, abaixando a mão. Ele deu dois passos para trás, ofegante, e caiu de joelhos.
Jonathan ajoelhou-se ao lado dele, mas manteve uma distância segura. “Você está bem? Consegue me ouvir?”
Carlos não respondeu de imediato. Ele segurou o rosto com as mãos, como se quisesse esconder o que havia acontecido. “Eu... não sei o que sou”, murmurou ele, a voz carregada de dor.
Jonathan colocou a mão no ombro dele, hesitante. “Você ainda é Carlos. Ainda é o meu parceiro. A gente vai descobrir como resolver isso.”
Carlos olhou para ele, os olhos voltando ao normal, mas carregados de lágrimas. “Eu não sei se posso voltar a ser quem eu era.”
Jonathan apertou o ombro dele com mais firmeza. “Você não precisa fazer isso sozinho.”
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