Noites Sangrentas Capítulo 4
Marcas do Passado
A delegacia parecia mais silenciosa do que o normal quando Carlos e Jonathan retornaram da Casa do Sapo. O relógio marcava pouco depois do meio-dia, mas o lugar parecia mergulhado numa penumbra pesada, como se até as lâmpadas tivessem medo de brilhar.
O Capitão os aguardava na sala de reuniões, braços cruzados, uma pilha de relatórios à frente. O olhar fixo exigia respostas rápidas.
— Mais dois desaparecimentos perto da mata — anunciou sem rodeios. — O que encontraram?
Jonathan relatou as pegadas e a garrafa química, mantendo a objetividade. Carlos, porém, permanecia calado, observando os papéis na mesa como se houvesse algo escondido neles.
— Carlos? — chamou o Capitão, impaciente.
Ele piscou, saindo de um devaneio.
— A coisa está se movendo. Rápido. Os rastros eram frescos. Ainda está por perto.
— Tem certeza? — o Capitão insistiu.
— Tenho — respondeu Carlos, firme.
Jonathan lançou-lhe um olhar de lado. A segurança na voz de Carlos parecia maior do que os fatos sustentavam. Parte dele queria acreditar. Outra parte… registrava a mudança com cautela.
Horas depois, revisando relatórios na sala de conferências, Carlos esfregava as têmporas com insistência, cada vez mais irritado com as contradições.
— Você dormiu alguma coisa? — perguntou Jonathan, tentando soar neutro.
— Estou bem — respondeu Carlos, seco.
Jonathan observou a caneta quase se partindo sob os dedos tensos do parceiro.
— Talvez uma pausa ajude. — Tentou um meio sorriso.
A cadeira de Carlos arrastou de repente.
— Não temos tempo. Cada minuto perdido pode custar uma vida.
O tom afiado fez Jonathan recuar ligeiramente. Nunca tinha visto Carlos perder o controle assim.
Pouco depois, Carlos deixou a sala sem uma palavra. Jonathan ficou, encarando os relatórios. Algo nele está mudando, pensou, e não sabia se era fadiga… ou outra coisa.
Na estrada, em direção ao último ponto de desaparecimento, o silêncio no carro era denso. Jonathan arriscou quebrá-lo:
— Você parece mais… focado. Mas não sei se isso me tranquiliza ou preocupa.
Carlos não respondeu. Fixou os olhos na mata adiante.
Chegando ao local, seguiram os rastros até uma clareira. Jonathan se agachou, iluminando o chão.
— Mais garras. E algo debaixo dessas folhas…
— Deixe isso — cortou Carlos, a voz tensa.
— Por quê? Pode ser prova.
— Só deixe. — O tom seco não admitia réplica.
Jonathan recuou, mas a desconfiança se acendeu.
Pouco depois, Carlos levou a mão à cabeça, apoiando-se numa árvore, o corpo tomado por dor súbita. Jonathan o segurou.
— Carlos! O que houve?
— Só… dor de cabeça. — A respiração ofegante.
Jonathan o encarou, tentando decidir se acreditava. Por fim, soltou o braço do parceiro, mas registrou mentalmente o episódio.
De volta à delegacia, Carlos mergulhou em silêncio na própria mesa. Tirou do bolso a cápsula metálica, colocando-a diante de si. O objeto parecia pulsar, atraindo e repelindo ao mesmo tempo.
Ele fechou os olhos. Flashes: uma floresta, luzes vermelhas, algo correndo sob a lua. Abriu-os rápido, suando frio.
— Controle… — murmurou, lendo a palavra gravada na cápsula.
Jonathan observava de longe, sem ser notado. E, pela primeira vez, se perguntou: até que ponto ainda podia confiar em Carlos?
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