Noites Sangrentas Capítulo 5
A Noite Observa
A noite desceu sobre a floresta com uma velocidade assustadora, e a mata parecia mais viva sob o brilho da lua cheia. O ar estava carregado, como se a própria floresta respirasse junto com os passos de Carlos e Jonathan. O silêncio era opressor, quebrado apenas pelo farfalhar das folhas e o som esporádico de animais noturnos.
“Isso não está certo”, murmurou Jonathan, apertando a arma com ambas as mãos enquanto tentava acompanhar o ritmo apressado de Carlos.
“Nada disso está certo”, respondeu Carlos, sem olhar para trás. Seus olhos estavam fixos nas pegadas que cortavam o solo lamacento. Eram grandes, profundas, indicativo de algo incrivelmente pesado. Os rastros ainda estavam frescos.
Jonathan ergueu a lanterna e iluminou o caminho à frente. “Carlos, eu sei que você quer resolver isso, mas estamos indo cada vez mais fundo. E se a coisa não estiver fugindo? E se formos nós os caçados?”
Carlos parou abruptamente e se virou para Jonathan, um olhar frio no rosto. “Você pode voltar se quiser. Mas eu não vou parar.”
Jonathan balbuciou algo inaudível, mas, conhecendo Carlos o suficiente, sabia que não adiantava argumentar. Seguiu em silêncio.
À medida que avançavam, a sensação de estarem sendo observados só aumentava. Carlos sentia um arrepio na nuca, mas não mencionava nada. Ele precisava manter Jonathan calmo, apesar da crescente ansiedade que o dominava — algo estava errado, mas ele não conseguia identificar o que exatamente.
“Olhe aquilo”, disse Jonathan, apontando para uma área mais aberta entre as árvores.
Ele andou sem rumo por algum tempo, os olhos varrendo a escuridão em busca de qualquer sinal dela. Mas o lugar estava vazio, silencioso demais. E então, ele ouviu.
— Arthur...
A voz veio de algum lugar à sua esquerda, um sussurro frágil e convidativo. Ele girou, os olhos arregalados.
— Carol? — Ele chamou, a voz trêmula e rouca.
Nada. Apenas o vento, carregando folhas secas e o som distante da cidade adormecida.
— Eu estou aqui... — o sussurro soou novamente, agora à sua direita.
Arthur virou-se bruscamente, o coração disparado. E então a viu — uma silhueta no meio da névoa, de pé ao lado de uma grande árvore morta. Ela usava a capa preta, o rosto escondido pela sombra, mas ele sabia que era ela.
Com passos trôpegos, ele avançou. A cada metro que se aproximava, sentia o mundo ao seu redor se desvanecer. A cidade, o cemitério, tudo desaparecia. Apenas Carol e ele existiam.
— Você voltou — ele murmurou, os dedos trêmulos se estendendo para tocá-la.
Mas, quando sua mão quase roçou o tecido, ela recuou, desaparecendo na névoa.
— Não! — Arthur gritou, a dor de vê-la se afastar quase física. — Por favor, não me deixe!
— Eu nunca vou te deixar — ela sussurrou de algum lugar atrás dele.
Arthur girou, o olhar frenético procurando por ela, mas só encontrou escuridão e vazio.
— O que você quer de mim? — ele gritou, caindo de joelhos. — Por que me trouxe aqui?
No galho de uma árvore, algo pendurado chamou a atenção. Era um animal morto, provavelmente um veado, com o corpo dilacerado de maneira grotesca. O sangue ainda escorria, formando uma poça escura que refletia a luz da lanterna, como se fosse uma mancha negra na terra.
Jonathan engasgou. “Isso foi recente. Muito recente.”
Carlos se aproximou, sua respiração ficando mais pesada. Ele sentiu o cheiro antes mesmo de chegar perto — um cheiro metálico e pungente, que lhe causou náuseas, mas ele não recuou. Olhou fixamente para a cena à sua frente.
“Carlos? Está tudo bem?”, perguntou Jonathan, mantendo distância.
“Estamos perto”, respondeu Carlos, em um tom quase absorto, como se falasse para si mesmo. “Muito perto.”
Eles seguiram por mais alguns minutos até chegarem a uma clareira, iluminada pela luz da lua cheia. O cenário era surreal, como se a própria floresta tivesse se moldado para criar um ambiente ainda mais opressor. Galhos retorcidos formavam sombras longas no chão, e o vento parecia trazer sussurros tênues entre as árvores. No centro da clareira, algo se movia.
Jonathan ergueu a lanterna e apontou a arma, mas ao que viu, suas pernas tremeram. “Meu Deus…”
Ali, diante deles, estava a criatura. Enorme, coberta por pelos negros e com olhos que brilhavam como carvões em brasa. Suas garras refletiam a luz da lua, e ela os observava com uma curiosidade quase inumana.
Carlos também ergueu sua arma, mas sua mão tremia levemente. Algo na criatura o paralisava, mas ele não sabia o que era. Era como se uma parte dele reconhecesse aquele ser, embora isso fosse impossível.
“Agora!” gritou Jonathan, disparando sua arma.
O som do tiro ecoou pela mata, mas a criatura se moveu com uma agilidade impressionante, desviando do projétil e desaparecendo nas sombras antes que eles tivessem chance de reagir.
Carlos correu em direção ao ponto onde a criatura desaparecera, ignorando os gritos de Jonathan. “Carlos, espere! Não podemos ir sozinhos!”
A perseguição seguiu por alguns minutos, mas a criatura parecia brincar com eles, deixando rastros visíveis apenas para desaparecer novamente. Jonathan estava ficando para trás, sua respiração ofegante denunciando o cansaço crescente.
Carlos parou de repente, uma sensação estranha o invadindo. Seu peito doía como se algo o estivesse apertando de dentro para fora. Ele se apoiou contra uma árvore, tentando recuperar o fôlego.
“Carlos! O que houve?”, perguntou Jonathan, alcançando-o.
“Só… uma dor de cabeça”, respondeu Carlos, ainda ofegante. “Vamos continuar.”
Jonathan olhou para ele com preocupação, mas não disse nada. Seguiu em frente, segurando a arma com mais firmeza.
Quando finalmente retornaram à clareira, algo havia mudado. No centro, onde antes havia apenas o vazio, agora havia marcas no chão — marcas dispostas de forma circular. Carlos se aproximou e se ajoelhou, examinando-as.
“Isso é um ritual”, disse ele, mais para si mesmo do que para Jonathan.
“Ritual? Como assim?”, perguntou Jonathan, iluminando as marcas com a lanterna.
Carlos passou os dedos pelas bordas das marcas, sentindo a terra ainda quente. Um calafrio percorreu sua espinha, mas ele não se afastou. “Isso não é só um animal. Tem algo mais aqui. Algo... humano.”
Jonathan franziu a testa, mas antes que pudesse dizer algo, um uivo distante cortou o silêncio da noite. Era profundo, quase primal, e imediatamente os dois se alertaram.
“Ela voltou”, sussurrou Jonathan, erguendo a arma. “Está perto.”
Carlos sentiu algo diferente, uma sensação que mexia com ele de maneira que não conseguia explicar. Sua respiração acelerou, e ele lutou para manter a compostura. “Vamos terminar isso”, disse ele, sua voz mais firme do que se sentia.
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