Noites Sangrentas Capítulo 6
Entre Sombras e Ossos
A lua cheia estava alta no céu, e a floresta parecia ainda mais viva sob sua luz. O ar estava denso, carregado, e cada passo de Carlos e Jonathan ecoava, como se a própria mata estivesse atenta a seus movimentos. O silêncio era denso, interrompido apenas pelo farfalhar das folhas e o som de algum animal distante.
"Isso não está certo", murmurou Jonathan, segurando a arma com ambas as mãos, os dedos tamborilando nervosamente na lateral. "Isso é uma armadilha, Carlos. Não tem outra explicação."
Carlos manteve os olhos fixos na trilha à sua frente, ignorando a inquietação de Jonathan. "Se for uma armadilha, significa que estamos perto. Quem ou o que fez isso não quer que a gente chegue mais fundo."
Jonathan parou por um momento, um suspiro de incredulidade escapando de seus lábios. "Isso é exatamente o que me preocupa. Se for humano... quem faria algo assim? Se não for..." Ele deixou a frase morrer, a tensão crescendo entre eles.
Carlos não respondeu. O silêncio entre os dois era opressor, preenchido apenas pelos estalos dos galhos sob seus pés e o sussurro do vento nas folhas. Algo em Carlos começava a incomodá-lo mais do que ele queria admitir. Sentia como se estivesse sendo observado, mas quando se virou, encontrou apenas a escuridão da mata, como se nada tivesse mudado.
Depois de mais de meia hora caminhando, chegaram a um trecho onde a trilha parecia desvanecer. As árvores ali eram mais altas, retorcidas, como se tivessem vida própria e observassem os dois intrusos.
"Tem alguma coisa aqui", murmurou Carlos, agachando-se para examinar o solo. Seu olhar estava focado, como se estivesse tentando encontrar algo além do óbvio.
Jonathan iluminou o chão com a lanterna. As folhas estavam afastadas, revelando um padrão estranho no solo — marcas profundas, quase circulares, e pequenos ossos quebrados espalhados ao redor. Jonathan engoliu em seco, sua voz tremendo. "O que é isso?"
Carlos pegou um dos ossos. Ele estava limpo, completamente desprovido de carne, como se tivesse sido raspado ou mastigado com precisão. Uma sensação desconfortante correu pela espinha de Carlos. Ele a sentia, a familiaridade que o fazia estremecer. Algo dentro dele parecia reconhecer aquilo, mas ele não sabia o quê.
"Não é um animal comum", disse ele, sua voz firme, mas com uma leve hesitação. Ele devolveu o osso ao chão e se levantou.
Jonathan deu um passo em direção às árvores ao redor, iluminando as sombras com a lanterna. "E se isso for mais do que uma criatura? E se estivermos lidando com algo que... nos observa? Como naquela clareira?"
Carlos ergueu os olhos para ele, vendo o brilho da lanterna iluminar o rosto de Jonathan. Ali, no olhar de Jonathan, Carlos viu mais do que medo. Era algo mais profundo, uma inquietação que se misturava com a curiosidade. Mas Carlos sentiu algo muito mais forte. Ele estava inquieto, mas por um motivo diferente — algo estranho, como se estivesse começando a perceber algo que estava além da explicação lógica.
"Carlos?", chamou Jonathan, a voz tensa.
"Estou aqui", respondeu Carlos rapidamente, tentando afastar a sensação desconcertante. Ele soltou a mão e respirou fundo. "Não é hora para isso. Vamos em frente."
Eles continuaram na trilha, adentrando a parte mais densa da floresta. A mata fechava-se ao redor deles, criando uma sensação de confinamento, enquanto as sombras pareciam crescer com cada passo. Carlos sentia uma presença invisível ao redor, um algo que o fazia olhar para os lados com frequência. Não era paranoia. Era algo mais real, algo que ele não queria admitir.
Jonathan foi o primeiro a notar algo estranho. "Carlos, para", ele sussurrou, puxando o braço de Carlos para impedi-lo.
Carlos virou-se rapidamente, a mão sobre a arma, mas Jonathan não o olhava. Seus olhos estavam fixos em algo à frente.
Arthur sentiu uma pontada de pavor. Mas então, como se algo além de sua compreensão o guiasse, ele estendeu a mão e pegou a capa que pendia dos ombros dela. A peça de tecido negro parecia pulsar sob seus dedos, e, ao puxá-la, sentiu uma onda de energia passar por ele.
— Para onde vai? — ele murmurou, vendo a silhueta de Carol começar a desvanecer.
— Para onde sempre deveria ter ido — ela respondeu, os lábios se movendo em um sorriso triste. — Para o descanso. Para a liberdade. Você me libertou, Arthur. Mas a maldição... a maldição precisa de um novo portador.
Ele piscou, confuso, e então a verdade o atingiu como um golpe físico.
— O quê? — ele arfou, os olhos arregalados. — O que você quer dizer?
— Alguém deve carregar o fardo, Arthur. Alguém deve usar a capa.
Ela se inclinou para ele, os olhos dela preenchendo todo o seu campo de visão. Ele tentou se afastar, mas os pés estavam presos ao chão, o corpo imobilizado.
— Não... — ele murmurou, o pânico se infiltrando em cada palavra. — Não! Você prometeu! Você disse que estaríamos juntos!
Carol apenas o observou, uma sombra de tristeza passando por seu rosto.
— E estaremos, Arthur. Mas de uma maneira diferente.
Ela ergueu a mão, e, com um movimento suave, colocou a capa em seus ombros.
Naquele instante, tudo mudou.
Arthur sentiu uma dor intensa atravessar seu corpo. Era como se cada célula estivesse sendo rasgada e reconstruída, como se uma força ancestral estivesse tomando posse de sua carne e de seu espírito. Ele tentou gritar, mas nenhum som saiu. Tentou se mover, mas estava preso. Apenas a dor, a angústia e a presença dela o preenchendo.
E então, quando pensou que não poderia mais suportar, o sofrimento cessou. O silêncio caiu, pesado e sufocante.
Entre as árvores, parcialmente oculto pela escuridão, havia algo agachado. Uma forma imensa, com a coluna arqueada e a cabeça baixa. Carlos sentiu o coração acelerar.
Jonathan moveu-se devagar, iluminando a figura com a lanterna. O feixe revelou uma criatura coberta por pelos negros e sujos, suas garras enterradas no solo. Quando a criatura levantou a cabeça lentamente, seus olhos brilharam como carvões incandescentes.
Jonathan paralisou. "Carlos..."
Mas Carlos não ouviu. Seu corpo ficou tenso, como se estivesse respondendo a algo primitivo, algo que ele não compreendia. O uivo da criatura cortou a noite, grave e ameaçador, mas ao invés de medo, ele sentiu uma estranha conexão. Algo dentro dele se acendeu, como se ele estivesse mais perto de entender do que nunca.
"Atire!", gritou Jonathan, disparando sua arma.
O som do tiro ecoou, mas a criatura moveu-se com uma velocidade sobrenatural, desviando do projétil e desaparecendo novamente nas sombras.
Carlos correu, seguindo a direção em que a criatura havia desaparecido, ignorando os gritos de Jonathan. "Carlos, espere! Não podemos ir sozinhos!"
A perseguição continuou, mas a criatura parecia se divertir, deixando rastros fáceis de seguir e desaparecendo de novo antes que pudessem alcançar. Jonathan estava ficando para trás, a respiração pesada denunciando o cansaço.
Carlos parou subitamente, sentindo algo estranho. Uma dor súbita no peito, como se estivesse sendo comprimido por algo invisível. Ele se apoiou em uma árvore, tentando se recuperar.
"Carlos! O que aconteceu?", perguntou Jonathan, alcançando-o.
"Uma dor de cabeça", respondeu Carlos, abafando a dor que crescia dentro dele. "Vamos continuar."
Jonathan o observou com preocupação, mas não disse nada. Ele apenas seguiu, apertando sua arma com mais firmeza.
Quando finalmente retornaram à clareira, algo havia mudado. No centro, onde antes havia apenas a terra vazia, agora havia marcas no chão, dispostas em um padrão circular. Carlos se aproximou e se ajoelhou, examinando com mais cuidado.
"Isso é um ritual", disse ele, mais para si mesmo do que para Jonathan.
"Ritual? Como assim?", perguntou Jonathan, iluminando as marcas com a lanterna.
Carlos passou os dedos pelas bordas das marcas, sentindo a terra ainda quente. Um calafrio percorreu sua espinha, mas ele não se afastou. "Não é só uma criatura. Tem algo mais aqui. Algo... humano."
Jonathan franziu a testa, mas antes que pudesse dizer algo, um uivo profundo cortou o silêncio, vindo de algum ponto distante na floresta. Era um som primal, que fez os dois ficarem alertas.
"Ela voltou", sussurrou Jonathan, erguendo a arma. "Está perto."
Carlos sentiu algo dentro de si, uma sensação de reconhecimento que não conseguia compreender. O som mexia com ele de uma maneira que era impossível de explicar. Sua respiração acelerou, mas ele não recuou. "Vamos terminar isso", disse ele, com a voz firme, embora por dentro não soubesse o que estava realmente enfrentando.
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