
As Golpistas Aime
— MAMÃE!
Seu pequeno corpo colide com o meu. Abaixo-me para abraçar minha filha, inalando aquele cheiro de morangos.
Aime tem os olhos pequenos e gatunos iguais aos meus. Suas bochechas redondas, seu cabelo liso, preto e curto na altura dos ombros. Usava uma jardineira amarela, com uma camiseta branca por baixo e seus pés estavam descalços.
— Como senti sua falta, minha coelhinha. — Apertei ainda mais em meus braços.
— Quem está aí, Aime? — Ouço minha mãe perguntar e chegar mais perto.
— Sou eu, mãe.
— JENNIE?AI, MEU DEUS!
Logo sou arrancada do chão por essa senhora que é mais baixa que eu. Seus cabelos brancos denunciam sua idade, e seus olhos, escondidos pelas armações grossas e redondas, mostram a sabedoria.
Ela usava um suéter marrom, calças de malha preta e uma pantufa rosa. Um horror para a moda, mas ainda assim era meu porto seguro. Seu cheiro natural parece de um pão recém feito. Ah, como eu amo a senhora Min-ji.
— Oi, mãe. Vim passar o final de semana com vocês.
O abraço da minha mãe começa a ficar frouxo e ela segura meu rosto. Muitos beijos são plantados em meu rosto e me sinto nas nuvens. Minha relação com meus pais não era dada a afeto, então aproveito essa migalha.
Logo sinto minhas vestes sendo puxadas e olho para baixo. Minha filha ergue os braços e prontamente coloco em meu colo.
— Como meu bebê está grande. — Digo, enchendo-a de beijos.
— Não sou mais bebê, mamãe. — Ela diz, com um pequeno bico.
— Então acho que darei o presente para outro bebê.
— Não, eu sou seu bebê. — Ela pegou suas mãozinhas e esmagou minhas bochechas, deixando um bico em meus lábios, que logo se transforma em um sorriso.
— Venham, vamos entrar, minha filha.
A casa de minha mãe tem o chão de madeira polida. Há uma escada logo na entrada, toda em verniz. O corrimão era branco, e havia um carpete preto nos degraus. Na esquerda, um pequeno corredor levava a sala de jantar e para a cozinha, que foi para onde seguimos.
A cozinha era funcional em estilo branco. Havia uma mesa com 3 cadeiras de adulto e uma para Aime. Uma chaleira no fogão começava a apitar, anunciando que estava fervendo.
Minha mãe pega em um dos armários uma xícara para mim. É branca com desenho de rosas e o píres era branco com uma única rosa no centro. Ela colocou um sachê de chá e logo adicionou a água quente. O aroma de jasmim invadiu minhas narinas.
— Mamãe, cadê meu presente? — Aime questionou.
Pegando em minha mochila, entrego o embrulho, o qual ela rasga velozmente. Seus olhos brilham ao ver a boneca e ela dá pequenos pulinhos.
— Obrigada, mamãe. Eu te amo mil estrelas.
— E eu te amo mil Sóis. — Respondi, carinhosamente.
Ela saiu brincar, deixando eu e minha mãe a sós. Minha Min-ji sempre foi uma mãe simples, direta e disciplinadora. Mas como avó, deixava Aime fazer o que quisesse. Eu admiro a mulher que ela é, apesar de sermos distante fisicamente.
— Como vai, JenJen? — Ela pergunta, adoçando seu chá em uma xícara igual à minha.
— Estou bem, na medida do possível. Trago notícias. — Digo, suspirando pesadamente.
— O que foi? Perdeu o emprego?
Seus olhos transmitem desconfiança e desmontam-me por dentro. Odeio decepcioná-la. Odeio como eles sempre fizeram o que podiam, mas no fim acabei ficando grávida e largado a faculdade.
Então menti. Quer dizer, mentira não é. Mas não era a novidade que queria contar.
— Não, mãe. Continuo empregada e guardando dinheiro. Mas, separei. — Era meia verdade e meia mentira.
— Graças a Deus, Jennie. — Ela levanta os braços. — Aquele homem era um traste.
Acabo sentindo alívio. Sei que ela sempre detestou Josh e eu deixei aquela situação chegar no limite. Mas me pego sentindo felicidade em ver que minha mãe me apoia nesse divórcio.
— Sim, mãe. Quero logo achar um lugar para levar a Aime. — Digo, tomando um gole do chá.
O líquido doce desce por minha garganta, causando um aquecer em meu íntimo. Sinto o calor invadir minhas bochechas e fecho os olhos, sentindo tudo ao redor. O cheiro de lar, a voz de minha filha, os pássaros cantando. Sentia falta disso.
— Estou com uma boa economia, mas quero ter uma casa primeiramente.
— Filha, Meme iria com você em qualquer casa. — Ela diz, tocando minha mão.
— E como ela está?
— Ela sente sua falta. — Minha mãe bebericou o chá e solta um suspiro cansado. — Ela sempre pergunta de você e quando você irá buscá-la.
Sinto o meu coração apertar. Eu sei que tenho sido uma mãe distante, mas achei que ela estaria bem com meus pais. Triste engano.
— Eu irei levá-la esse ano, é uma promessa.
Minha mãe apenas assente e volta a tomar o chá. Mergulhamos no silêncio, mas sempre foi assim. Nunca fomos de conversar e ainda mais coisas banais. Eu sinto falta disso. Imagino que se fossemos amigas, muitas coisas poderiam ser diferentes.
Ouço a porta abrir e Aime correr.
— VOVÔ, A MAMÃE 'TÁ' AQUI!!!
— Que coisa boa, minha netinha.
Vejo meu pai chegando com Aime em seu colo. Seu rosto enrugado e armação pequena e quadrada o fazem a aparência de sua idade. Ele usava um chapéu pescador, assim como a roupa de um. Em sua mão havia um cooler pequeno, onde aposto que havia peixes, devido ao aroma predominante.
— Pai, que bom ver o senhor. — Levanto e faço uma pequena reverência.
Ele apenas sorri e coloca o cooler na pia e então deixa um beijo em minha testa.
— Que bela surpresa, meu lírio.
— Vim passar o final de semana aqui. — Informo, sorrindo.
— E o trabalho? — Ele pergunta
— O senhor Arnold fechou a loja para balanço. — Minto, pois não quero decepcionar e mostrar para minha mãe que havia mentido para ela.
— Você deveria ter ficado e ajudado, assim ele veria suas competências e deixaria de ser avarento, te pagando o que é justo.
— Ele nem quis me ouvir, pai. Apenas me dispensou.
— Vou subir para tomar banho. Querida, os peixes já estão limpos, apenas tempere e frite para o jantar.
E assim ele nos deixou. Aime desceu de seu colo e me puxou para o seu quarto. Subo as escadas segurando uma de suas mãos, a outra estava ocupada com sua boneca. Seu quarto era o meu anteriormente, mas estava modificado.
As paredes rosa com pequenos corações ornavam com os móveis brancos. Sua cabeceira da cama tinha um quadro com inúmeras pinturas, e ao lado da cama havia uma pequena mesa, onde havia vários materiais para desenhos.
Ela pega uma por uma e vai me mostrando. A maioria era ela com seus avôs, crianças vizinhas e animais. Mas havia uma em especial. Ela estava na escrivaninha branca, onde havia um abajur pequeno e delicado.
O desenho era de duas meninas. Uma pequena e outra maior. Meu coração disparou ao ver que se tratava de nós duas. Meus olhos enchem de lágrimas, ao lembrar que estou perdendo essa fase com minha filha.
— O que foi, mamãe? Não gostou? — Ela pergunta triste. — Eu posso fazer outro.
— A mamãe amou tanto que quer levar para casa. — Digo, segurando meus soluços.
— A mamãe pode?
— Por que 'tá' chorando? Não chora, mamãe.
Aime sobe em meu colo, plantando beijos em minha bochecha e secando minhas lágrimas. Logo sou eu quem a beija e arranca pequenas risadinhas. Sua gargalhada contagia o ar, fazendo com que eu mesma gargalhe.
— Para, mamãe. — Ela pede, rindo alto.
— Só se você disser que me ama.
— EU TE AMO, MAMÃE, EU TE AMO. PARA, POR FAVOR.
Acabo cessando as cócegas e agora planto beijos em seu rosto, enquanto a abraço fortemente. Meu nariz mergulha em seus cabelos, inalando aquele odor único. Meu corpo relaxa e começo a niná-la, cantando baixinho em seu ouvido.
Se eu pudesse, ficaria assim para sempre. Ela foi meu alicerce, minha âncora. Sei que não deveria ter tido uma filha tão cedo, mas as coisas aconteceram. E não me arrependo de ter engravidado.
Talvez eu me arrependa das circunstâncias. Mas dela? Nunca. Ela foi meu Sol, restaurando a vida dentro de mim e me gerando calor. Ainda lembro da primeira vez que ela me chamou de mãe.
Ela tinha alguns meses, onze para ser exata, e estávamos tentando fazer ela falar mamãe, vovó e vovô. Ela estava toda suja de iogurte, balbuciando e babando. E do nada soltou um 'MAMA'.
Lágrimas escorreram em meu rosto na hora e senti a felicidade transbordar em meu peito. Senti como se houvesse ganhando uma loteria e nada me abalaria. Eu havia conquistado a porra do melhor prêmio do mundo.
Não sei quanto tempo passei ali, sentada com ela. Desenhamos e brincamos com a sua nova boneca. Ela fez um desenho de nós três e penduramos em seu quadro. Ela fez vários corações ao nosso redor.
Eu desenhei nós duas em uma cama elástica, pulando alto. Ela sempre teve vontade de ir nesses parques infantis, mas nunca consegui dinheiro suficiente. Espero que um dia eu realize seu sonho.
Acordo de meus devaneios quando escuto a porta ser batida. Minha mãe abre e nos espia. Ela possui um doce sorriso em seu rosto. Se aproxima e vê os desenhos. Sua mão alisa os cabelos de Aime.
— Que lindo, minha flor. — Ela diz. — Agora lavem as mãos e venham jantar.
Ela se retira e Aime imediatamente se levanta. Vejo minha filha ser independente e se limpar sozinha. Sinto uma pontada no coração ao perceber que ela logo não precisará de mim. Então eu faço uma promessa.
Vou te levar para casa, Aime. Custe o que custar.
Indíce
-
Na Literaz, a leitura gratuita é possível graças à exibição de anúncios.
-
Ao continuar lendo, você apoia os autores e a literatura independente.
-
Obrigado por fazer parte dessa jornada!