
As Golpistas Inferno
P.O.V Jennie
Acordo com o grito estridente de meu alarme. Semicerrando os olhos, alcanço meu maldito smartphone e desligo o mesmo. Mal acordei e já sinto a enxaqueca tomar conta do meu ser. Tateio cegamente ao lado do meu companheiro e sinto o local vazio.
"Idiota passou mais uma noite na farra."
Sinto o ódio fervilhar em meu ser. Maldito Josh, me traindo todo maldito dia. A sua sorte sou eu não amá-lo mais, sendo assim não dói mais como antes .Mas ele poderia esperar a porra do divórcio.
Me levanto e começo a me arrumar para o meu maldito emprego .Eu odeio aquele lugar. Odeio como o velho Arnold olha para mim como um pedaço de carne. Odeio ele pague pouco e odeio mais ainda o fato de eu não conseguir sair de lá.
Acabo vestindo uma calça social preta, um par de saltos velhos e uma camiseta branca com o logo da joalheria que trabalhava.
Tomo meu café e me apresso para sair. Não sem antes fazer meu ritual diário, ao lado da entrada desse muquifo, mantenho uma foto de minha filha, Aime. Sorrio ao acariciar seu rosto, beijando a imagem brevemente.
"Eu ainda irei te ter comigo, minha princesa. A mamãe promete."
Após trancar a porta, saio a caminho do metrô. A cidade fede, um aglomerado de pessoas caminhando aceleradamente, focados em suas vidas e tristezas próprias. Outra coisa que odeio é morar no centro de Nova Iorque, além do aluguel ser exorbitante, ainda há milhares de pessoas que empurram-se mutualmente nas calçadas.
Chego na estação, e ainda há filas intermináveis de usuários .A estação necessária está abarrotada de pessoas, o que gera-me um enjoamento ocasionado pela mistura de odores.
Eu sei, você já leu diversas vezes como odeio tudo. Mas se vivesse minha vida, a odiaria também.
Acabo por ficar em pé, sendo esmagada por todos os lados. Sinto a malícia de um homem ao encostar em mim, e acabo me esmagando ainda mais em outra pessoa. O bafo fétido denunciando embriaguez. A repulsa instala-se em meu âmago e tento me deslocar naquela lata apertada.
Finalmente chego ao meu destino, saio rapidamente para que não sofra piores lesões. O ar entra em meus pulmões, mas não alivia a sensação claustrofóbica em meu ser.
Enquanto divago, acabo tropeçando na calçada. Merda!
— Porra, não acredito!-Exclamo.
A vida não me dá uma maldita folga? Meu salto quebrou e acabou machucando meu tornozelo. A minha sorte é estar a poucos passos do meu trabalho. Segurando o maldito calçado, ando mancando, com um pé descalço.
Entro igual a um furacão, com Arnold analisando-me de cima a baixo. Velho nojento e tarado. A hora que eu conseguir sair desse local, vou colocar fogo.
Brincadeira... ou não.
—— Bom dia, Jennie. Está atrasada. -Seu sorriso debochado me enraiveceu.
Arnold é um homem de 60 e poucos anos, que usa Crocs preto, calça de flanela e suéter marrom. Todo-santo-dia. Eu me pergunto se ele conhece senso de estética. Sua joalheria ao menos é bonita.
Ao lado de uma das vitrines, exibimos joias douradas, banhadas a ouro. Braceletes, colares, brincos, relógios. Artigos de luxo que competem entre si, para ver qual é o mais bonito.
No outro lado são as joias de prata. Reluzentes e delicadas. Sempre quis cada uma dessas peças, mas minha renda não permite.
Há dois balcões de vidros, onde há mais joias e irmãs dessas peças. Eu atendo onde fica o balcão de anéis, isso inclui os de moda, namoro, casamento e etc.
Arnold é um velho rico, ganancioso e sovina. Sua esposa vive em amarras, sempre tendo que implorar para comprar algo. Vejo como ela humilha-se muitas vezes para comprar uma roupa ou calçado.
Se eu tivesse o dinheiro que ele possui, pegaria minha filha e iria embora desse país. Sinto falta da Coreia, mas desde que meus pais vieram para cá, em busca de uma vida melhor, nunca mais fui para lá. Sinto falta dos meus amigos, do meu idioma e principalmente de não sofrer xenofobia.
— Vai me ignorar?-O velho seboso questinou.
— Desculpe, Arnold. Estava divagando.-Respondo-lhe.-Sim, atrasei dois minutos pois meu sapato estragou, mas já estou aqui.
Ele acenou com a cabeça e me dirijo para os fundos, onde tenho uma sapatilha guardada. Troco a peça inútil e sigo para começar o dia.
Respiro fundo quando alguns clientes entram e coloco meu melhor sorriso, enquanto uso a simpatia e tento vender sempre o que querem. Apesar de não receber comissão, preciso desse emprego.
Penso em Aime, minha filha. Ela possui apenas quatro anos e convive com meus pais. Quero melhorar de vida, fazer faculdade e trazê-la para mim. Sinto sua falta todos os dias, falta de seu abraço, seu cheiro. Ela é a minha vida.
Pensar nela ameniza toda a dor sentida. Todo o caos que é meu 'casamento', minha vida e rotina.
Mergulho de cabeça no trabalho e quando vejo já é a hora do almoço. Fecho a loja e volto para os fundos, onde há um armário, uma mesa com uma cadeira, uma geladeira antiga e um micro-ondas do tempo de Cristo.
O armário é de ferro e há manchas de ferrugem. A mesa é redonda e branca, feita de plástico, assim como a cadeira. A geladeira é efeito anos 50, uma única porta com duas gavetas e um freezer. O micro-ondas um dia estava branco, hoje é amarelado e por dentro há claros sinais de ferrugem.
Como não trago comida, acabo esquentando a água e jogando em meu Cup Noodles. Como silenciosamente, grata pelo silêncio. Ele permite que minha mente divague enquanto leio um romance qualquer.
A única coisa boa do local onde trabalho é ter um sebo ao lado. Comprei um livro há mais de um ano e troco por um novo toda semana. A senhora proprietária gosta de mim, então quando finalizo uma leitura, devolvo o livro e pego outro de volta.
Quando acaba meu almoço, volto de novo ao ritual de felicidade forçada. É cada cliente esnobe que sinto minhas entranhas enrolarem de nojo.
Eu até admiro a mim mesma, com a facilidade que sou falsa. Eu deveria ser atriz, iria enganar tanta gente, seria incrível. Se bem que sou gostosa, então eu seria muito invejada. Melhor não.
Finalmente são 17:45 e logo estarei indo embora. Começo a arrumar as gavetas e o mostruário. Escuto a porta abrir e viro-me para o cliente que entrou. Meu sangue gela na mesma hora.
— Passem tudo! ANDA!
O ladrão olha para mim, mas aponta a arma para o Arnold. Seu rosto estava encoberto por uma clava, usava uma camiseta preta e jaqueta de couro. Sua calça era colada em seu corpo. Seus olhos castanhos fixaram-se em mim, analisando-me da cabeça aos pés.
— Vamos, vovô, não tenho o dia todo.
Seu olhar voltou para Arnold, que começou a abrir as gavetas desesperadamente.
— Só dinheiro, vovô. -Exigiu, usando a arma como indicativo.
Por favor, não olhe para mim. Por favor.
— E você, passe a bolsa. -Disse, apontando a arma para mim.
— Porra, eu só tenho seis dólares, que irei usar para voltar para casa. -Gemo, frustrada.
—Não interessa, boneca. Passa tudo.
Sinto o ódio consumir meu seu e jogo a bolsa com força. Aponto um dedo para o ladrão e grito com raiva.
— Então acho bom você me buscar quando sair daqui.
Ele teve a audácia de rir e sair. Confesso que achei sua risada linda, mas não é para eu pensar isso.
Céus, como irei embora? Acabo escorrendo na parede e abafo meu choro com minha mão. Quando registro que devo ir embora, levanto a cabeça e me deparo com a polícia. É claro, Arnold os chamou.
Após pegarem meu relatório, fui liberada. Porra, o velho nem sequer pensou em ajudar-me. Puta que pariu, vou ter que ir caminhando até minha casa. Meu dia não poderia estar melhor.
Ando furiosa, com lágrimas em meus olhos. Sinto a humilhação tomar meu ser e não reprimo minha tempestade. Enquanto ando, vejo um carro preto indo lentamente ao meu lado.
Era só o que me faltava, um tarado seguindo meus passos. Ele buzina e eu ignoro. Então ele abre o vidro e revela ser uma mulher. Seus cabelos pretos estavam descendo lisos sobre o ombro, uma franja imaculada em sua testa. Ela deu um sorriso para mim, que fez meu cérebro entrar em circuito.
— Oi, você pediu carona. -Ela diz para mim.
Acabo piscando e reconhecendo a roupa. A jaqueta de couro e a calça colada. Puta merda, é uma mulher. E linda.
— Você veio me buscar?-Questiono.
Ela deu de ombros e voltou a sorrir.
— A senhora pediu, eu vim.
— E por que acha que eu iria aceitar?-Indago, afinal ela é linda, mas uma completa estranha.
— Porque minha mãe fez lasanha.
Confesso que dei uma pequena risada. Olhei novamente para ela. Sua aparência era de uma desordeira, seu sorriso era travesso e em sua testa estava escrito:ENCRENCA. Então havia apenas uma resposta plausível:
— Qual sabor?
Indíce
-
Na Literaz, a leitura gratuita é possível graças à exibição de anúncios.
-
Ao continuar lendo, você apoia os autores e a literatura independente.
-
Obrigado por fazer parte dessa jornada!