
As Golpistas O envelope
— E quem seria?
— Seu nome é Jennie Kim.
— E como isso ajudaria?
— Eu tenho um plano...
O amanhecer deixava a cidade linda. Claro, era um mar de concreto, mas não deixava de ser linda. O carro deslizava pelo asfalto, com um movimento quase nulo, um andar tranquilo. Um jazz suave tocava, deixando um ambiente relaxante.
Lisa parecia tão radiante quanto eu. A nossa noite deixou nossa pele reluzente, como se fossemos renovadas. Eu me sinto renovada, nada melhor do que gozar para caralho. E agora estamos indo para minha casa tomar café.
A casa dela é melhor, mas ela está fazendo tanto por mim que quero contribuir. Sei que parece bobagem, ela não pediu nada em troca. Mesmo assim, é bom poder retribuir o mínimo que seja.
Sem falar que estou com uma fome tremenda depois dessa noite. Ou madrugada, como queira pensar. Só de lembrar de tudo, um fogo acende em mim. Haja fogo no rabo, me sinto igual a Minnie agora.
Lisa batucava seus dedos no volante, acompanhando o ritmo. Às vezes ela assobiava, cantava baixinho, mostrava felicidade. Só de pensar que talvez a razão desse sentimento seja por causa minha, aquece meu ser.
Logo chegamos em minha casa, o movimento acontecendo gradualmente na rua. Quando ela estacionou, fui fazer menção de sair do automóvel, mas Lisa segurou meu braço, me impedindo de sair.
Dando a volta, ela chegou em minha porta e a abriu. Segurando minha mão delicadamente, Lisa deu um beijo casto, e me guiou para fora. Que cavalheira, nem parece que estava
enfiando 3 dedos na minha buceta há pouco tempo.
— Entregue viva, Senhorita Kim.
Dei uma risadinha e fui abrir a porta para entrarmos. Porém, algo me chama a atenção: um envelope pardo em cima de meu tapete. Cuidadosamente o pego e vejo não haver remetente, apenas meu nome.
— Estranho. — Analiso o pacote, parece haver certo peso.
— Não estava esperando por isso? — Lisa pergunta.
— Não. Vem, vamos tomar café e vemos isso.
Abro a porta e a deixo entrar. Lisa olha ao redor pela primeira vez, analisando cada canto. Sinto minha bochecha arder com vergonha de não ser um espaço grande. Sei que é besteira, mas só os humildes sabem como é comparar as coisas.
Lisa se aproximou da entrada, onde havia um móvel com porta-chaves e o retrato de Aime. Ela pegou a foto e levantou à altura de seus olhos. Um sorriso pequeno apareceu em suas expressões e ela perguntou, sem desviar os olhos.
— Essa é sua filha? — Afirmei com um 'uhum' — Ela é linda, tem muito de você.
Orgulho preenche meu peito. Não que não quisesse que ela fosse parecida com o pai dela, mas carreguei ela por nove meses. Eu mereço que ela seja minha cópia, sem falar que sou linda, então elogiar ela é como me elogiar.
— Quero muito a conhecer, Jen.
— Preciso primeiro de uma casa adequada, então vou trazer ela para mim.
— Vou ajudar você com isso, boneca.
Acabo sorrindo mediante sua ajuda. Me aproximo dela e encaixo nossas mãos. Seu rosto vira para mim, se abaixando apenas alguns centímetros, para que pudéssemos selar nossos lábios.
Não importa quantas vezes eu a beije: sempre terá essa eletricidade. Sua boca se molda a minha e nos movimentamos, para que encaixasse melhor. Logo sua canhota desceu para minha cintura, trazendo-a para perto de mim.
Antes que ela pudesse aprofundar e perder minha sanidade, afastei meu corpo. Senti cada molécula de minha pele reclamar, mas dei a noite toda e preciso de descanso. Minha companheira debaixo precisa descansar.
— Volta aqui, boneca. — Lisa reclama.
— Não, vou fazer o café.
Saio de perto dela, antes que tenha uma recaída. Lisa tirou o paletó e está apenas de calça social e cropped. Por favor, pai celestial, dê forças para sua guerreira. Ela está lutando arduamente contra o pecado.
Deixo o envelope na bancada e vou para a cozinha. Seleciono os itens para fazer panquecas e coloco café fazer na máquina. Lisa arrastou aquele corpo para esse ambiente e sinto seu olhar em mim.
Isso me deixa nervosa, mas finjo que estou plena. Chego até a cantarolar, enquanto faço os procedimentos. Lisa observa cada movimento meu, com um olhar intenso, como se estivesse olhando a coisa mais interessante do mundo.
Na verdade, até que eu sou. Acredito fielmente que deveria estar exposta em alguma vitrine, ou ser a mocinha de algum MV. Mocinha não, mas cairia bem como aquela gostosa que não se rebaixa a nada.
Após finalizar nossas panquecas, coloco Lisa para arrumar a mesa. Gente folgada é só eu mesmo, o resto tem que colocar trabalhar. Eu, hein, mereço isso não. Quer dizer, não quero ser folgada também. Tem que ser um equilíbrio, duas folgadas que se ajudam.
Pego as caldas e o chantilly e coloco na mesa. Nossa, sei cozinhar muito, Lisa não irá morrer de fome comigo. E bem, ela também tem uma comida deliciosa, então estamos muito equilibradas nesses quesitos.
— Isso aqui está delicioso. — Lisa fala de boca cheia.
— Eu sei, querida. Fui eu quem fez. — Digo, com toda humildade que habita em mim.
— Gosto da sua humildade, ela combina com a minha.
— Somos perfeitas, querida.
— Vai abrir o envelope? — Lisa aponta para ele.
— Curiosa você, hein.
Me levanto e vou até o local pegar o maldito envelope. Levo para a mesa e abro lentamente, sentindo algumas folhas deslizarem para fora. Acho que não é nada até que as viro e paraliso com o que estão nelas.
As imagens são todas de mim. Quando estava com meus pais, passeando com Aime, na rodoviária, na noite que fui no racha, caminhando. Eram fotos atuais, mostrando que alguém me seguia.
— O quê? — Pergunto, perdida.
— O que é, Jennie? — Lisa pergunta, olhando para as fotos. — É você?
— Sim... sou eu. — Disse, mas sentindo minhas pernas falharem.
— Jennie, você está sendo seguida?
Acabo caindo na cadeira, sentindo uns pontos pretos em minha vista. Cara, nem sou rica, o que diabos querem de mim? Minhas roupas? Minha inteligência? Minha beleza? Só tenho isso a oferecer.
— Mas não tenho nada, querem extorquir o quê?
— Tem só fotos?
Ela pega o envelope e chacoalha e um pedaço de papel caí. Fico entorpecida e apenas vejo Lisa se abaixar para pegá-lo no chão. Ela lê, franzindo a testa. Seu olhar recaí sobre mim e estende o bilhete.
" Jennie, Jennie, Jennie. Você dança na borda do precipício, sem perceber o abismo que a espera. Aproveite a música enquanto ela ainda toca."
O quê?
EU. NÃO. ESTOU. ENTENDENDO. NADA!
Dança? Abismo?
O que está acontecendo, pai amado?
Primeiro, respira, Jennie. Tenta manter a calma, tenta entender a situação.
Você está sendo seguida e alguém está te ameaçando. Você deve para agiotas? Andou humilhando alguém? Bateu em velhos? Deu golpe em universitário?
Creio que não, ou então bati a cabeça e esqueci o que andei fazendo.
— Arruma suas roupas, você vai comigo?
Pisco, estasiada. Olho para Lisa, que está segurando as fotos fortemente.
— Ouviu, Jennie? Vá arrumar sua mala, você não fica um minuto aqui.
Concordo com a cabeça e vou para meu quarto. Pego minhas malas antigas e soco toda roupa que tenho. Cinco malas estufadas estão presentes, mas paro e analiso um pouco essa situação.
— Lisa, as minhas coisas?
Ela aparece no quarto, olhando para as malas. Se abaixa e pega duas.
— Pegue aquilo que te é importante. O resto compro depois.
Ai, como é rica. Saio do quarto, levando uma mala comigo. Lisa pode com duas, então ela volta pegar. Vou aos cômodos e levo apenas aquilo que me importo. Coloco em algumas caixas e finalizo tudo.
É meio triste ver que minha vida se resume a cinco malas e três caixas. Enquanto fico perdida, Lisa vai guardando as coisas no carro. Não posso deixar de sentir um leve aperto no meu coração, com essa partida.
Sim, era um lugar péssimo. Sim, morei com um homem pior ainda. Sim, não irá fazer falta, mas ainda assim vivi muito tempo ali. Ainda tem alguma essência minha perdida. É como se despedir de uma parte de sua vida.
— Vamos, Jennie. Não quero você nesse lugar.
Ela pega em minha mão e me leva até seu Jeep. Apenas me deixo guiar, e sinto meu corpo seguir o curso. Ainda parece um sonho nebuloso, onde só quero acordar. Mas não, estou acordada e sendo sequestrada por vontade própria.
Lisa está no telefone, falando com alguém. Entendo apenas trechos, como ' seguida', 'segurança', e 'minha casa'. Então meu cativeiro será sua casa. Isso não me desagrada, porém, não quero ficar lá, ocupando espaço e tirando sua privacidade.
Já queria me mudar mesmo, apenas adiantei o processo. Ainda nem recebi o primeiro salário, contudo com minhas economias, consigo algo e comprar móveis novos. Não serão aquelas coisas, mas é um começo.
— Não se preocupe. — Lisa pegou minha mão e beijou suas costas. — Irei cuidar de você.
Sorrio com sua preocupação. Não somos nada e aquele afligimento para comigo, é de derreter as calotas polares. Sempre sonhei com meu príncipe, será que Lisa será minha princesa resgatadora?
Espero que não, sou autossuficiente. No entanto, não negarei sua ajuda.
Obrigada por estar comigo, Lisa, e mostrar como não ficarei doente caso não abra o guarda-chuva.
Indíce
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